quinta-feira, 5 de janeiro de 2023

Dom Esmeraldo Barreto Farias: “Se todas as atividades não partem da missão, tudo vai ficar voltado para nós mesmos”


A missão é da natureza da Igreja, é fundamento, afirma Dom Esmeraldo Barreto Farias, um dos bispos que participam da I Experiência Vocacional Missionária Nacional que acontece em Manaus de 5 a 17 de janeiro de 2023. Seguindo as diretrizes da Igreja no Brasil, “a missão é um eixo que contribui para que todas as dimensões e todos os trabalhos, todas as atividades possam estar marcadas pela missionariedade”, destaca o Bispo da Diocese de Araçuaí (MG).

Se todas as atividades não partem da missão, que é a manifestação do amor, da misericórdia de Deus, tudo vai ficar voltado para nós mesmos”, segundo Dom Esmeraldo, que vê a missão como “esse testemunhar o Amor de Deus que se manifesta em Jesus Cristo e nas pessoas, especialmente nos gestos de solidariedade e de caridade”. Para trabalhar isso em quem está no caminho da formação “tem que ser a partir do Evangelho”, e assim “possam acolher a vida mesma de Jesus”.

O bispo afirma que “partindo do Evangelho eu vou buscar a seguimento a Jesus Cristo”, buscando o encontro, como diz o Papa Bento XVI em “Deus Caritas est”. Por isso, ele afirma que “o encontro com Jesus Cristo, ele define, porque ele me dá horizonte, ele me dá perspectiva de viver como seu discípulo missionário e viver como Igreja”.

Um segundo ponto é “ajudar os seminaristas a trabalhar numa pedagogia que considere as experiências concretas”, o que permite “entrar na mistagogia”, ressalta o bispo. Se referindo à experiência vivenciada nestes dia em Manaus, ele afirma que “ela me faz descobrir os sinais de Deus, e a medida que eu estou aberto para escutar a voz de Deus e descobrir seus sinais nas pessoas, nas realidades, em especial nos mais pobres, naqueles que vivem nas periferias, eu vou acolher dentro de mim aquilo que Deus me fala a mim pessoalmente, mas também o que é que Deus está dizendo para o mundo de hoje, para a Igreja hoje, para as comunidades eclesiais hoje”.



Dom Esmeraldo insiste em que “a experiência missionária, ela não seja um corte na formação”, sem ter em conta essa experiência dentro da comunidade formativa. Por isso, ele insiste numa experiência “que marque o processo formativo e que esteja em inteira conexão com o processo formativo”, algo que nem sempre acontece, como ele já percebeu pela sua missão como bispo, pois experiências missionárias não eram retomadas na vida normal do Seminário, o que mostrava que a atividade pastoral, ela era um corte que não repercutia em nada no Seminário. Isso o levou a promover uma interligação entre vida pastoral dos seminaristas e o processo normal da formação.

O Bispo de Araçuaí insiste em que para ajudar aos seminaristas a partir do Evangelho, da pessoa e da missão de Jesus, a partir de experiências concretas e que essas experiências possam incidir no processo formativo, não sendo um corte, mas tendo uma interrelação. Desta experiência em Manaus, Dom Esmeraldo insiste em que o que interessa “é ver qual a repercussão dessa experiência, daquele fato, daquele sinal que eu descobri na vida daquela pessoa, daquela realidade, daquelas comunidades, qual a repercussão disso para minha vida”.

Se não for assim, “eu vou ser um ator que chega ali naquela comunidade, faz uma encenação, mas só que depois aquilo não entra na vida dele”, insiste o Bispo. Junto com isso destaca a importância de um devido acompanhamento, “para que ele possa ir fazendo o devido discernimento dessa experiência na sua vida”. Por isso, os formadores e formadoras que acompanham esse processo “precisam ter claro um horizonte”, insiste, que leve a descobrir “qual é o tipo de ministério ordenado para o qual eu estou ajudando a preparar esses jovens”. Algo que supõe uma Cristologia, que supõe uma visão de Igreja, de pessoa, de realidade, de abertura, ressalta Dom Esmeraldo.

Em resume, ele destaca que “precisamos presentar claramente a pessoa e a missão de Jesus, precisamos trabalhar o processo formativo com as dimensões intelectual, espiritual, comunitária, pastoral, com experiências concretas, precisamos fazer uma integração dessas experiências, porque senão não vai mudar nada na vida do jovem”. Daí que o Bispo destaque que “precisa ajudar aquele formando a compreender que a partir das pessoas, dos fatos e das realidades é o próprio Jesus que está falando”, e junto com isso a repercussão dessas experiências na vida de cada um, insistindo em que cada formando precisa estar aberto a essa formação como condição necessária para estar no processo formativo.



O fato dessa experiência acontecer na Amazônia leva Dom Esmeraldo a lembrar a frase do Papa Paulo VI: “Cristo aponta para a Amazônia” enviada aos bispos reunidos em Santarém em maio de 1972. Daí ele diz que “essa experiência precisa mostrar uma abertura para a vida missionária”, algo reconhecido nas diretrizes para a formação presbiteral, que leve os seminaristas a “compreender que ele não está sendo preparado para cuidar de um rebanho que é reunido, mas ele está sendo preparado para uma abertura para os grandes desafios que nós temos das muitas periferias”.

“A experiência aqui na Amazônia aponta para uma visão da ecologia integral que o Papa Francisco insiste tanto na Laudato Si´”, destaca Dom Esmeraldo. “Nós não podemos no trabalho de evangelização e também no trabalho formativo, não podemos ver de forma dualística a pessoa e as realidades da vida, as realidades do mundo”, afirma, citando a visão do Papa sobre a ecologia integral como elemento que “nos faz ver também no processo formativo que precisa ser um processo integral onde as várias dimensões estão interligadas, e ao mesmo tempo onde eu preciso estar aberto àquilo que eu sinto da presença de Deus”.

Por isso, vir para a Amazônia, uma realidade que Dom Esmeraldo conhece pois ele já foi Bispo de Santarém e Arcebispo de Porto Velho, “também mostra que a Igreja do Brasil precisa estar aberta para a missão ad gentes não só fora do Brasil, mas também para uma abertura que nos faz enxergar para além da diocese”. Nesse sentido coloca a existência de dioceses no Brasil onde são muitos os padres, mas que “quase nunca se abre para uma outra necessidade do Brasil onde nós temos tantas necessidades, não só do ministro ordenado, mas também a necessidade de abertura para uma Igreja ministerial, uma Igreja que acolhe as pessoas e que ajuda as pessoas a descobrirem o seu sentido, seu caminho”.

Também ele destaca a ajuda desta experiência no caminho sinodal, “como uma realidade como essa tão específica da Amazônia, como é que ela espalha luz para o Brasil inteiro e como é que nós que estamos em outros lugares fora da Amazônia, como é que isso pode refletir numa abertura para com a Amazônia”. Dom Esmeraldo lembra a visão até poucos anos atrás em relação com a missão na Amazônia, vista como algo para congregações ou institutos religiosos, e não para o padre diocesano.



Daí, o Bispo de Araçuaí insiste em que “essa abertura que a Amazônia nos dá é para nos mostrar que precisamos estar abertos para que também o presbítero diocesano possa entender que a missão é de sua natureza”, fazendo um chamado a descobrir que todo presbítero diocesano tem que estar aberto para a Igreja e para as periferias, também presentes na Amazônia e que irão ser visitadas nesses dias. Nesse sentido, Dom Esmeraldo denunciou que a Amazônia é vista como algo de segunda categoria, o que se demostra no modo em que é tratada por órgãos governamentais, em benefício das mineradoras, em benefício das grandes empresas.

Dom Esmeraldo ressalta que “o missionário visitante, ele não está para substituir o missionário residente. Ele precisa compreender que tanto aquele que nos acolhe nas comunidades quanto aquele que vai, os dois são missionários, e precisam vivenciar essa realidade missionária sem um querer tomar o lugar do outro”. Por isso, ele chama aos participantes da missão a “acolher os sinais de Deus na vida dessas pessoas e aprender com elas”, afirmando que “a ministerialidade começa a partir daí, eu não vim para tomar o lugar de ninguém”, se limitando a um possível incentivo, esclarecimento, ajuda, fortalecimento, dar um passo a mais, mas nunca a substituição.

Tudo isso o leva a afirmar que “se eu tomo o lugar do outro, eu não estou contribuindo para fortalecer esse ponto tão importante que eu considero que é um outro pilar da comunidade eclesial missionária, a Palavra, os sacramentos, a liturgia-caridade e a ministerialidade, que aí os quatro se integram, e a missão como eixo que faz com que todos esses pilares possam estar interagindo”.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

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