segunda-feira, 24 de julho de 2023

Dom Leonardo Steiner: Jesus no Evangelho nos ensina o passo da pequenez


“O semeador sai a semear. A semente lançada na terra em pleno dia, tem um longo caminho. O caminho da frutificação. Lançada na terra, ela se aninha, lança raízes, apresenta lenta e silenciosa as suas folhas verdes, sinaliza o dom de seu verdor, a vida que deseja multiplicar-se. Na alegria que a brisa oferece não se apercebe do incômodo e sofrimento que a rodeia”, disse o cardeal Leonardo Steiner no início de sua homilia no 16º Domingo do Tempo Comum.


Comentando o texto, o arcebispo de Manaus disse que “em meio da noite, veio o inimigo, semeou joio no meio do trigo. Cresce o trigo, cresce também o joio. O semeador ao contemplar o campo percebe que cresce também o que não é trigo. Difícil de distinguir. Só os cultivadores experientes percebem a sua presença e do perigo. O desejo é arrancar o joio”.


Segundo Dom Leonardo, “num mesmo campo trigo e joio; num mesmo campo, mas com destinos diferentes. Num mesmo campo, o mesmo solo, o mesmo sol, a mesma chuva, mas frutos diversos. Um fruto saboroso quanto grão triturado, farinha, pão cozido. O outro apenas fungos tóxicos que podem levar à morte”.


Lembrando as palavras de Papa Francisco, o cardeal disse que “Jesus nos ensina que a atitude do dono do campo é aquela da esperança fundada na certeza de que o mal não é a primeira nem a última palavra. E é graças a esta esperança paciente de Deus que o próprio joio, ou seja, o coração maldoso, com muitos pecados, no final pode tornar-se uma boa semente. (...) Perante o joio presente no mundo, o discípulo do Senhor é chamado a imitar a paciência de Deus, a alimentar a esperança com o alento de uma confiança inabalável em Deus”.




Ele insistiu em que “a semente não cresce e não chega à sua maturidade, à sua frutificação, à colheita, sem experimentar as contrariedades, as fraquezas, as desilusões, os desânimos, as frustrações. A mesma terra que nutre o pé de trigo, nutre o pé do joio”. Isso porque “o caminho da semente, da Palavra às vezes é longo. Exige paciência, humildade, para perceber a transformação que pode ocorrer em nós. Quanta desarmonia, discórdia, insatisfação, intriga, desconforto e ao mesmo tempo quanto desejo de amizade, de aconchego, de perdão, de reconciliação, de harmonia, de vida frutificada. Joio, cizânia: a discórdia, a briga, a rixa, a desavença, a falta de harmonia. Trigo: viço, força, graciosidade que vem à luz, vida flor, florida”.


“E esses desejos, essas realidades falam, dizem, expressam o caminho da semente-palavra, a Palavra, o Evangelho, em nós. E na desatenção da escuta, voltamos nosso olhar e ouvidos para as limitações, as fraquezas, as impossibilidades e perdemos os passos do Evangelho. No descuido e distração às vezes não nos damos conta que damos mais atenção à cizânia que ao trigo; e às vezes nos apercebemos cheios de desejos de eternidade, de cuidado, de entrega. Vamos caminhando e vamos tentando. Mas o grande desejo seria arrancar os conflitos, o sofrimento. Essas nossas incapacidades, incompreensões, tensões que nos tiram a tranquilidade e nos levam quase ao desânimo”, segundo Dom Leonardo.


O arcebispo de Manaus advertiu que “a nossa tentação é de nos livramos da finitude humana carregada de fraqueza. Quantas vezes até fazemos promessas para nos livrarmos de fraquezas que nos afligem, e damo-nos conta que elas continuam. Quantos pensamentos, sentimentos, desejos contrários à vida do Evangelho. E nós lutando para nos desfazer, superar, desvencilhar desses incômodos existenciais que nos acompanharão até a hora de nossa morte”.


Uma semente do Evangelho lançada “no meio do joio da injustiça, da desigualdade, da corrupção, da vingança, da violência, da apolítica, encontra dificuldade de crescer, maturar, das fruto. No entanto, a força da semente no meio das tensões e sofrimentos da sociedade permanece como esperança de transformação. Crermos que o Evangelho recebido e semeado transforma, liberta, deixa surgir frutos de fraternidade, acolhimento, de paz. O Evangelho sempre desperta frutos de esperança em meio à realidade da fragilidade humana social”.  




“Livrar, rejeitar a nossa finitude, a nossa humanidade frágil?”, perguntou Dom Leonardo, que lembrou o texto da Cata aos Romanos da segunda leitura do dia (Rm 8,26-27), e também o texto de 2Cor 12,10. Ele insistiu em “quanta confiança, quanta esperança, quanta perseverança suscita a semente da Palavra, o Evangelho. No meio das distrações, das tensões, dos desamores, das negações, das injustiças, do ódio, a semente, a Palavra, imperceptível e suavemente, tempera e anima os passos. Também na transformação da nossa sociedade”.


Jesus no Evangelho nos ensina o passo da pequenez, disse o presidente do Regional Norte1 da CNBB, citando o texto e afirmando que “a semente que recebemos é pequenina, miúda, quase desprezível, mas pronta explodir e vir à luz, frutificar, abrigar”. Segundo ele, “a dinâmica, o movimento do Evangelho, é feita na pequenez, na pobreza, na simplicidade, na humildade; nada de suntuoso, grandioso, espetacular. Necessita ser despojado, pequenino, contido, recolhido. Extraordinária a semente a Palavra de Deus, quando encontra terra boa, cresce e cresce e cresce... e abriga vidas voadoras que ali descansam e fazem casas para suas crias”.


“Na escuta da Palavra, às vezes, estamos à espera de grandes transformações e não nos apercebemos o seu movimento próprio: dia após dia, dia-a-dia, quase monótona e perseverantemente vai crescendo, busca espaço, seiva, transformando sais e minerais em vida verdejante. Uma semente de mostrada pequenina, mas viva; pequenina, cheia de vida, pronta para crescer e acolher. A Palavra fazendo-se vida em nossa vida, vida na vida da sociedade. E isso, sem arrancar a finitude, a humanidade”, segundo Dom Leonardo.


Lembrando o texto do Evangelho, “O reino dos céus é semelhante ao fermento”, Dom Leonardo destacou que “é como se dissesse: como o fermento muda substancialmente a farinha, assim também nós somos transformados”. Ele lembrou que “Jesus não disse simplesmente: ‘Que pôs’, mas sim misturou, como que ‘escondeu’; como se tivesse dito: desapareceu, mas transformou. E assim como o fermento se vai corrompendo, mas não se destrói, e pouco a pouco muda toda a massa em sua própria natureza. A mesma dinamicidade, a mesma energia transformativa acontece com a Palavra de Deus em nós. No meio das dificuldades e fragilidades leva à maturidade e estatura de Cristo”. 




“O fermento é perceptível no crescer da massa e na beleza e sabor do pão partilhado. A Palavra, qual fermento vai dando beleza e profundidade aos nossos dias, sem nos deixarmos perturbar demais com a cizânia, com o joio. Jesus nos convida a fixar olhar no trigo bom, mesmo em meio das ervas daninhas”, disse Dom Leonardo.


Ele fez um chamado a que “aprendamos com Deus, Ele sabe esperar”, lembrando as palavras do Papa Francisco onde afirma que “Ele olha a vida de cada pessoa com paciência e misericórdia. Vê muito melhor que nós a perversidade e o mal, mas vê também o germe do bem e espera com confiança que amadureçam. Deus é paciente e sabe esperar. O nosso Deus é um pai paciente, que sempre nos espera, e nos espera com um coração humano, para nos acolher, para nos perdoar. Ele sempre nos perdoa, se vamos até ele. O compromisso do “patrão” do evangelho é com a esperança, fundada na certeza de que o mal não tem nem a primeira nem a última palavra. Mais: graças a essa paciente esperança de Deus, a própria cizânia, isto é, o coração mau, cheio de pecados, pode tornar-se enfim um bom grão”.

Em palavras do arcebispo, “como Deus paciente e maternalmente nos oferece as sementes da Palavra, a vida de Jesus, deveríamos, paciente e paternalmente, cultivar a graciosidade do Evangelho. Perseverar no caminho, deixar frutificar a Boa Nova com a simplicidade, a pequenez, a humildade e o vigor da semente de mostarda; com a paciência e a misericórdia do fermento que vai levedando a massa, a nossa sociedade, a nossa Igreja. Pois, como ouvíamos na primeira leitura: Deus julga com clemência (...), ensina o seu povo que o justo deve ser humano; e aos filhos e filhas deu a confortadora esperança de que concede o perdão aos pecadores! (Sb 12,13.16-19)”.


Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

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