O bispo auxiliar de Manaus afirma que “o Papa está
confirmando que estamos no caminho certo”. Segundo ele, “a Igreja do Brasil, já
desde o Concilio Vaticano II, vem valorizando a vocação e missão dos leigos e
das leigas, destacando seu protagonismo na comunidade eclesial e na sociedade,
vem sempre falando do protagonismo dos leigos e das leigas. Nesse caso sempre enfatizando a presença das mulheres na
vida da igreja”. O documento pontifício vai respaldar o que vem sendo feito,
mesmo que isso não é algo unânime, não acontece em todos os lugares. Dom José
afirma que “não é uma questão feminista que está em jogo, é uma visão de Igreja,
toda uma compreensão daquilo que a gente é. A Igreja não pode viver em guetos,
com divisão, deixando alguém fora da missão da evangelização, que é para todos”.
O motu proprio nos ajuda a “relembrar
que todos nós somos um povo sacerdotal. Isso inclui também as mulheres, a gente
não pode cometer esse equívoco, que o masculino é aquele que tem mais espaço,
que tem mais importância, nada disso”, insiste Dom José Albuquerque. Para ele é
motivo de alegria “saber que o Papa Francisco está nos ajudando a abrirmos
caminho, incentivando as mulheres a terem uma maior atuação em todos os espaços
possíveis, pensando em que as mulheres possam ter uma maior participação”. Segundo
o bispo auxiliar de Manaus, “esses serviços ligados à liturgia, não podem ser
considerados os mais importantes, nem os mais imprescindíveis na organização da
Igreja, nem na dimensão pastoral, nem muito menos no que diz respeito à
dimensão teológica”.
Falando da experiência da Amazônia e da arquidiocese de Manaus, onde Dom José Albuquerque foi ordenado padre diocesano há quase 25 anos, ele afirma que “já temos uma caminhada bem consolidada, falando da presença das mulheres”. Em Manaus, “as mulheres já recebem o ministério da Palavra, aonde não só as mulheres podem proclamar a Palavra de Deus, que isso já é uma prática de mais de 40 anos, mas aqui as mulheres podem presidir a celebração da Palavra”, algo que já acontece em todo o Brasil, e que deve ser assumido nos lugares onde não está acontecendo.
Para Dom José Albuquerque, a
presença das mulheres, “para nós aqui da Amazônia é quase que imprescindível,
porque muitas comunidades não poderiam celebrar se não tivesse essa presença e
essa liderança. A imensa maioria das nossas lideranças são mulheres, das várias
faixas etárias, também jovens mulheres participando dessa linha de frente”. O
documento do Papa pode abrir a possibilidade de outros ministérios, afirma o
bispo, como é o ministério do catequista. Ele diz que “quando a gente fala do
catequista, 90% são mulheres. Então por que não dizer o ministério da
catequista, seria uma forma de valorizar esse serviço que é tão necessário na
evangelização”. A partir daí “podemos pensar outros ministérios, nesse tempo de
pandemia, o ministério da consolação, rezar nos velórios, dirigir exéquias. São
celebrações que as mulheres já fazem em muitos lugares onde não tem o ministro
ordenado, seja o padre, seja o diácono”, segundo ele.
A mesma coisa com “o ministério
da caridade, o ministério de ajuda aos pobres, não só de visita, mas de
promover ações concretas de solidariedade”, insiste Dom José, lembrando que “muitas
mulheres estão atuando junto aos moradores de rua, aos migrantes, as pessoas
que estão vivendo situações de fragilidade social, com esses milhões que estão
passando por tremendas dificuldades”. Também a Pastoral da Criança, onde as
mulheres “exercem um verdadeiro ministério, visitando as famílias, acompanhando
as crianças, as grávidas, ajudando na formação espiritual, cuidando da dimensão
da saúde da família”, um ministério que o bispo define como “quase
revolucionário, são agentes de pastoral que estão atuando fora do espaço físico
da comunidade, da Igreja”. Inclusive, ele diz que “eu faço uma associação com a
pessoa de Jesus, que vai visitando as pessoas nas suas casas, e lá vai
evangelizando, vai compartilhando a vida da família, vai levando ânimo, alegria”.
Diante da pergunta que algumas
pessoas se fazem sobre por que o Papa não é mais ousado?, Dom José Albuquerque
destaca que “a gente sabe que as mudanças não acontecem de cima para baixo, ele
está apenas, em nome da Igreja, aquilo que o Espírito Santo está fazendo, todo
esse movimento de mudança, de transformação que vem pouco a pouco das
periferias, dos lugares mais distantes”. Nas comunidades mais distantes da
Amazônia a gente se depara com “a atuação de verdadeiras líderes, de mulheres que
dão um testemunho bonito da fé. A Igreja, de algum modo na Amazônia, ela
continua existindo e caminhando graças às mulheres, isso não tenhamos dúvidas,
porque a grande maioria daquelas que assumem os mais diversos serviços, dentro
e fora da comunidade eclesial, são mulheres”.
O motu proprio é consequência
do Sínodo para a Amazônia, onde Dom José foi um dos padres sinodais. Ele
destaca que “isso foi unânime na voz das mulheres que lá estavam na sala
sinodal, mas também foi um refrão muito repetido por parte de muitos bispos,
não só na América Latina, mas também em outras partes do mundo”. O bispo
insiste em que “não podemos falar e agir desta forma, deixando as mulheres de
lado, ou colocando-as num papel secundário”. Estamos diante de “uma forma de
reforçar a eclesiologia do Vaticano II, somos Povo de Deus a caminho, e esse
povo não está preso a uma estrutura piramidal, pelo contrário, a gente está
sempre aprendendo, revendo”.
O processo de escuta do Sínodo
para a Amazônia mostrou a importância de que “ninguém fique de fora desse
processo”, as mulheres, os povos indígenas, as comunidades quilombolas,
ribeirinhos, as comunidades mais distantes. Não podemos, afirma Dom José, “olhar
para as mulheres como se fossem simplesmente colaboradoras, elas são também
protagonistas”, algo apontado pelo Papa. Para ele, “a grande lição do Sínodo
foi que vale a pena a gente sentar para escutar, e o Papa está fazendo isso, e
por isso que ele está incomodando, porque essas ações nos forçam a sair do
nosso comodismo”.
Esse é um desafio, escutar,
algo que o Papa Francisco faz. O Sínodo “não foi apenas um momento formal, mas
ele está sendo muito respeitoso com todos os apelos que foram feitos. E os
apelos das mulheres foram muito fortes, ele ficou repercutindo muito, tanto é
que ele fez questão de ter encontros com as mulheres, religiosas, leigas,
indígenas, ligadas aos movimentos sociais, foi um momento muito bonito que o
Papa teve essa sensibilidade para encontrar-se com elas”. Sem esquecer que “foi
o número mais significativo de mulheres participando de um Sínodo”.
No Sínodo foi pedido a criação
do ministério da mulher dirigente da comunidade. Na Arquidiocese de Manaus,
isso já acontece em muitas comunidades, onde existe uma coordenação, e a grande
maioria dessas coordenações são confiadas a mulheres, escolhidas em assembleia,
que recebem um envio. Segundo Dom José Albuquerque, “essas experiências, elas
servem para mostrar que as mulheres, mesmo que não seja de forma oficial, elas
já exercem esse serviço”, destacando que além daquilo que é ligado à questão
litúrgica, as mulheres assumem a responsabilidade da evangelização naquele
bairro. Ele reflete dizendo que “nós estamos lidando com essa dimensão do
litúrgico, do sagrado, que ainda está muito ligado a uma figura masculina. É
sábio o Papa nos ajudar a perceber que é preciso dar um passo após o outro”.
“A gente tem que começar com
essas experiências nas bases, nas periferias, tudo o que acontece na Igreja tem
que ser assim, não é do centro para a periferia, nem de cima para baixo, pelo
contrário”, segundo o bispo. Ele destaca o “desafio de viver isso como uma ação
do Espírito e não como uma resposta sociológica a um desafio presente, é o
Espírito que está conduzindo”. Para o bispo auxiliar de Manaus, “isso vai nos abrir
a possibilidade de outros ministérios”.
Alguém que é membro da Comissão
Episcopal para os Ministérios Ordenados e a Vida Consagrada da CNBB, vê a
necessidade de um trabalho conjunto entre as diferentes comissões que cuidam
das diferentes vocações, pois “vocação diz respeito a todos, não só a quem quer
ser ministro ordenado ou religiosa”. Ele afirma que “quando um documento do
Papa é publicado, isso exige estudo, reflexão e debate para poder olhar a nossa
realidade”, se abrindo às diferentes experiências que acontecem no Brasil, que
devem ser vistas como “uma oportunidade de acordar e caminhar juntos”, como “um
convite para a gente vivermos em comunhão e unidade, nem que seja pela fé que
temos naquilo que a autoridade de um Papa nos representa”.
A questão não e só de obediência,
“é uma questão de viver em comunhão, de perceber que a vontade de Deus está se
manifestando pela palavra de nossa autoridade maior, do Papa, na qual os bispos
deviam ser os primeiros em fazer chegar a todos aquilo que o Papa está dizendo”,
algo assumido pela grande maioria do episcopado brasileiro, que Dom José vê “em
sintonia com essas reflexões do Papa”.
Linda e importante a reflexão de Dom José. As mudanças não vem de cima mas da base. O Espírito Santo não está parado. Temos que nos abrir a luz de Deus
ResponderExcluir