“O semeador sai a semear. A semente lançada na terra
em pleno dia, tem um longo caminho. O caminho da frutificação. Lançada na
terra, ela se aninha, lança raízes, apresenta lenta e silenciosa as suas folhas
verdes, sinaliza o dom de seu verdor, a vida que deseja multiplicar-se. Na
alegria que a brisa oferece não se apercebe do incômodo e sofrimento que a
rodeia”, disse o cardeal Leonardo Steiner no início de sua homilia no 16º
Domingo do Tempo Comum.
Comentando
o texto, o arcebispo de Manaus disse que “em meio da noite, veio o inimigo,
semeou joio no meio do trigo. Cresce o trigo, cresce também o joio. O semeador ao contemplar o campo percebe
que cresce também o que não é trigo. Difícil de distinguir. Só os cultivadores
experientes percebem a sua presença e do perigo. O desejo é arrancar o joio”.
Segundo Dom Leonardo, “num mesmo
campo trigo e joio; num mesmo campo, mas com destinos diferentes. Num mesmo
campo, o mesmo solo, o mesmo sol, a mesma chuva, mas frutos diversos. Um fruto
saboroso quanto grão triturado, farinha, pão cozido. O outro apenas fungos
tóxicos que podem levar à morte”.
Lembrando as palavras de Papa Francisco, o cardeal disse
que “Jesus nos ensina que a atitude do dono do campo é aquela da esperança
fundada na certeza de que o mal não é a primeira nem a última palavra. E é
graças a esta esperança paciente de Deus que o próprio joio,
ou seja, o coração maldoso, com muitos pecados, no final pode tornar-se uma boa
semente. (...) Perante o joio presente no mundo, o discípulo do Senhor é
chamado a imitar a paciência de Deus, a alimentar a esperança com o alento de
uma confiança inabalável em Deus”.
Ele insistiu em que “a semente
não cresce e não chega à sua maturidade, à sua frutificação, à colheita, sem
experimentar as contrariedades, as fraquezas, as desilusões, os desânimos, as
frustrações. A mesma terra que nutre o pé de trigo, nutre o pé do joio”. Isso
porque “o caminho
da semente, da Palavra às vezes é longo. Exige paciência, humildade, para
perceber a transformação que pode ocorrer em nós. Quanta desarmonia,
discórdia, insatisfação, intriga, desconforto e ao mesmo tempo quanto desejo de
amizade, de aconchego, de perdão, de reconciliação, de harmonia, de vida
frutificada. Joio, cizânia: a discórdia, a
briga, a rixa, a desavença, a falta de harmonia. Trigo: viço, força,
graciosidade que vem à luz, vida flor, florida”.
“E esses desejos, essas realidades falam, dizem, expressam
o caminho da semente-palavra, a Palavra, o Evangelho, em nós. E na desatenção
da escuta, voltamos nosso olhar e ouvidos para as limitações, as fraquezas, as
impossibilidades e perdemos os passos do Evangelho. No descuido e distração às
vezes não nos damos conta que damos mais atenção à cizânia que ao trigo; e às
vezes nos apercebemos cheios de desejos de eternidade, de cuidado, de entrega.
Vamos caminhando e vamos tentando. Mas o grande desejo seria arrancar os
conflitos, o sofrimento. Essas nossas incapacidades, incompreensões, tensões
que nos tiram a tranquilidade e nos levam quase ao desânimo”, segundo Dom
Leonardo.
O arcebispo de Manaus advertiu
que “a nossa tentação é de nos livramos da finitude humana carregada de
fraqueza. Quantas vezes até fazemos promessas para nos livrarmos de fraquezas
que nos afligem, e damo-nos conta que elas continuam. Quantos pensamentos,
sentimentos, desejos contrários à vida do Evangelho. E nós lutando para nos
desfazer, superar, desvencilhar desses incômodos existenciais que nos
acompanharão até a hora de nossa morte”.
Uma semente do Evangelho lançada “no
meio do joio da injustiça, da desigualdade, da corrupção, da vingança, da
violência, da apolítica, encontra dificuldade de crescer, maturar, das fruto.
No entanto, a força da semente no meio das tensões e sofrimentos da sociedade
permanece como esperança de transformação. Crermos que o Evangelho recebido e
semeado transforma, liberta, deixa surgir frutos de fraternidade, acolhimento,
de paz. O Evangelho sempre desperta frutos de esperança em meio à realidade da
fragilidade humana social”.
“Livrar, rejeitar a nossa finitude, a nossa humanidade frágil?”, perguntou Dom Leonardo, que lembrou o texto da Cata aos Romanos da segunda leitura do dia (Rm 8,26-27), e também o texto de 2Cor 12,10. Ele insistiu em “quanta confiança, quanta esperança, quanta perseverança suscita a semente da Palavra, o Evangelho. No meio das distrações, das tensões, dos desamores, das negações, das injustiças, do ódio, a semente, a Palavra, imperceptível e suavemente, tempera e anima os passos. Também na transformação da nossa sociedade”.
Jesus no Evangelho
nos ensina o passo da pequenez, disse o presidente do Regional Norte1 da CNBB, citando o texto e
afirmando que “a semente que recebemos é pequenina, miúda, quase desprezível,
mas pronta explodir e vir à luz, frutificar, abrigar”. Segundo ele, “a
dinâmica, o movimento do Evangelho, é feita na pequenez, na pobreza, na
simplicidade, na humildade; nada de suntuoso, grandioso, espetacular. Necessita
ser despojado, pequenino, contido, recolhido. Extraordinária a semente a
Palavra de Deus, quando encontra terra boa, cresce e cresce e cresce... e
abriga vidas voadoras que ali descansam e fazem casas para suas crias”.
“Na escuta da Palavra, às vezes, estamos à espera de
grandes transformações e não nos apercebemos o seu movimento próprio: dia após
dia, dia-a-dia, quase monótona e perseverantemente vai crescendo, busca espaço,
seiva, transformando sais e minerais em vida verdejante. Uma semente de
mostrada pequenina, mas viva; pequenina, cheia de vida, pronta para crescer e
acolher. A Palavra fazendo-se vida em nossa vida, vida na vida da sociedade. E
isso, sem arrancar a finitude, a humanidade”, segundo Dom Leonardo.
Lembrando o texto do Evangelho, “O reino dos céus é semelhante ao
fermento”, Dom Leonardo destacou que “é como se dissesse: como o fermento muda
substancialmente a farinha, assim também nós somos transformados”. Ele lembrou
que “Jesus não disse simplesmente: ‘Que pôs’, mas sim misturou, como que ‘escondeu’;
como se tivesse dito: desapareceu, mas transformou. E assim como o fermento se
vai corrompendo, mas não se destrói, e pouco a pouco muda toda a massa em sua
própria natureza. A mesma dinamicidade, a mesma energia transformativa acontece
com a Palavra de Deus em nós. No meio das dificuldades e fragilidades leva à
maturidade e estatura de Cristo”.
“O fermento é perceptível no crescer da massa e na beleza e sabor do pão
partilhado. A Palavra, qual fermento vai dando beleza e profundidade aos nossos
dias, sem nos deixarmos perturbar demais com a cizânia, com o joio. Jesus nos convida
a fixar olhar no trigo bom, mesmo em meio das ervas daninhas”, disse Dom
Leonardo.
Ele fez um chamado a que “aprendamos com Deus, Ele
sabe esperar”, lembrando as palavras do Papa Francisco onde afirma que “Ele
olha a vida de cada pessoa com paciência e misericórdia. Vê muito melhor que
nós a perversidade e o mal, mas vê também o germe do bem e espera com confiança
que amadureçam. Deus é paciente e sabe esperar. O nosso Deus é um pai paciente,
que sempre nos espera, e nos espera com um coração humano, para nos acolher,
para nos perdoar. Ele sempre nos perdoa, se vamos até ele. O compromisso do
“patrão” do evangelho é com a esperança, fundada na certeza de que o mal não
tem nem a primeira nem a última palavra. Mais: graças a essa paciente esperança
de Deus, a própria cizânia, isto é, o coração mau, cheio de pecados, pode
tornar-se enfim um bom grão”.
Em palavras do arcebispo, “como Deus paciente e maternalmente
nos oferece as sementes da Palavra, a vida de Jesus, deveríamos, paciente e
paternalmente, cultivar a graciosidade do Evangelho. Perseverar no caminho,
deixar frutificar a Boa Nova com a simplicidade, a pequenez, a humildade e o
vigor da semente de mostarda; com a paciência e a misericórdia do fermento que
vai levedando a massa, a nossa sociedade, a nossa Igreja. Pois,
como ouvíamos na primeira leitura: Deus julga com clemência (...), ensina o seu
povo que o justo deve ser humano; e aos filhos e filhas deu a confortadora
esperança de que concede o perdão aos pecadores! (Sb 12,13.16-19)”.
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