sexta-feira, 26 de julho de 2024

Mons. Lucio Ruiz: Sínodo digital, “um novo capítulo do que significa e sempre significou a missão na Igreja”


Um lugar para ser missionado, é assim que o Secretário do Dicastério para a Comunicação do Vaticano, Monsenhor Lucio Ruiz, vê o ambiente digital. Isso é algo que ele promoveu com o Sínodo digital, despertando interesse em todas as partes do mundo e em todos os níveis da Igreja, gerando “a esperança de que um novo capítulo possa ser aberto para o que significa e sempre significou a missão na Igreja”.

Por essa razão, ele insiste que “a primeira coisa importante é entender que o digital não é um instrumento, mas uma cultura”, para tomar medidas para incorporar o digital no grande fluxo missionário da Igreja, em um ambiente, as redes, no qual as pessoas estão procurando respostas, o significado que a Igreja é chamada a oferecer. Não se deve esquecer que 30% dos participantes do Sínodo digital eram não crentes ou pessoas que haviam se afastado, e que isso trouxe novos batismos e pessoas que retornaram à Igreja.

Isso requer uma linguagem que seja compreendida, porque “o chamado à nossa porta que a missão digital faz é prestar atenção em como, ao mudar a linguagem, podemos também alcançar as pessoas novamente, podemos alcançar pessoas que não estavam escutando antes”. O desafio será “saber como viver nesses ambientes” e “ser capaz de unir instituição e carisma”.

Conhecer a cultura digital é um dos desafios apresentados no Instrumentum laboris para a Segunda Sessão da Assembleia Sinodal do Sínodo sobre a Sinodalidade. Existe um desejo entre a hierarquia de conhecer a cultura digital? Como o grupo de estudos sobre Missão no ambiente digital, do qual o senhor faz parte, pode ajudar a aumentar esse interesse?

O interesse pela cultura digital e as possibilidades que ela apresenta para a evangelização, para a missão, especialmente para aqueles que estão mais distantes, para aqueles que estão buscando, para aqueles que estão sofrendo, para aqueles que têm perguntas. Com todas as pessoas que encontrei durante esse período do Sínodo digital, esse interesse existe, é forte, e está expresso no capítulo 17 do Relatório Síntese da Primeira Sessão da Assembleia Sinodal, porque é a primeira vez que a ideia de missão em ambientes digitais aparece em um documento da Igreja.

Nunca antes se falou em missão no ambiente digital, considerando-o como um lugar aonde temos que ir em missão. E é por isso que o Sínodo abriu uma porta na Igreja, pois estamos verificando que em todo o mundo esse interesse está surgindo, bispos, conferências episcopais, dioceses, estão ligando, querendo saber sobre missionários digitais, e isso nos dá esperança de que um novo capítulo pode ser aberto para o que a missão na Igreja significa e sempre significou.

O trabalho do grupo 3, que é o grupo que o Papa criou com o Dicastério para a Comunicação, o Dicastério para a Educação, o Dicastério para a Cultura e o próprio Sínodo, é a manifestação do que o próprio Sínodo quer fazer, porque o Sínodo, no capítulo 17, diz que isso deve ser feito. O Grupo 3, o que ele tem que responder é como fazer isso, e é por isso que as perguntas que são colocadas ali são orientadas para pensar, refletir, perguntar à Igreja como realizar a missão digital.





O Relatório Síntese da Primeira Sessão da Assembleia Sinodal define a cultura digital como uma dimensão crucial do testemunho da Igreja. Que medidas devem ser tomadas para tornar isso concreto?

A primeira coisa importante é entender que o digital não é uma ferramenta, mas uma cultura. Não é um dispositivo que temos de aprender a manusear melhor, que nos permite produzir vídeos, postagens ou coisas que são úteis para o trabalho pastoral, mas é um ambiente para habitar e, portanto, é uma missão que temos de realizar. Quando começamos a pensar nessa realidade como um lugar, percebemos o valor do testemunho. Missão, estar presente e dar testemunho da vida de um cristão nesse lugar.

Se, em vez disso, continuarmos a pensar nele como um instrumento, só nos referiremos a especialistas, a cursos para manejá-lo melhor e usá-lo para determinadas coisas. Se, por outro lado, fizermos a transição de instrumento para cultura, perceberemos que temos uma expressão para viver nossa fé, dar testemunho dela e levá-la a outras pessoas.

O conceito de missionários digitais está se tornando cada vez mais difundido, e como eles podem contribuir para a comunicação do Evangelho no campo da missão? Podemos dizer que já existem frutos concretos dessa missão digital?

O fato de o Sínodo chamar de missão e de missionários todas as atividades que ocorrem nas redes, nos espaços digitais, significa que ele as está incorporando ao grande fluxo missionário da Igreja. Não é algo que possa ser feito ou que tenha que ser feito, mas a missão é a vida da Igreja. E isso pode colaborar muito na missão, mesmo ad gentes, porque sendo a cultura digital que permeia todos os ambientes de nossa cultura, com inteligência, com criatividade, com ousadia e com sua própria linguagem, usando seu próprio tempo, usando sua própria narrativa, ela nos permite alcançar pessoas que de outra forma não seriam alcançadas de nenhuma outra maneira.

Quando você vê pessoas navegando na Web em busca de respostas, em busca de significado, poder estar presente, dar respostas, oferecer a possibilidade de escutar, apresentar uma mensagem de esperança em um mundo que está procurando um sentido para a vida, isso é um fruto concreto do que pode ser a missão digital. E foi isso que experimentamos durante esse tempo, nesse projeto “A Igreja escuta você”, que está em andamento há dois anos e meio, vimos exatamente isso.

Quando fizemos a experiência do Sínodo digital, 30% das 150.000 pessoas que participaram da primeira fase, que foi de apenas dois meses de trabalho, eram descrentes, ou pessoas que estavam distantes, com raiva da Igreja. E elas quiseram participar porque, depois de tantos anos se sentindo rejeitadas, sentiram-se escutadas. E vimos nas respostas como elas queriam continuar, como queriam se aprofundar. Houve até pessoas que, sentindo-se tocadas pela proximidade da Igreja por meio das redes, pediram para ser batizadas. Houve batismos desde o Sínodo digital, pessoas que retornaram à Igreja, pessoas que passaram a conhecer a fé.

Portanto, é uma possibilidade. Temos de dizer claramente que não é uma missão para ficar lá, mas é uma missão para ir até onde as pessoas estão, para um primeiro anúncio, e depois levá-las a uma presença plena, a uma presença plena com Jesus, para que o conheçam, para que o sigam, para que o vivam, e uma presença plena também com a comunidade, porque todos nós precisamos ser capazes de nos encontrar, de nos ver, de nos abraçar, de sentir o calor. É uma missão, mas não para ficar, é uma missão para estar presente, para levar todos à presença plena.



O senhor fala sobre a linguagem, que é a base da comunicação e também da evangelização. Muitas vezes queremos evangelizar, mas não entendemos o que estamos dizendo. Nesse campo da missão digital, quais são os passos que a Igreja, especialmente a hierarquia, deve dar para encontrar uma linguagem que seja compreendida, especialmente por aqueles que mais habitam o mundo digital, que são os jovens?

Sempre gosto de usar o exemplo da história de Pentecostes, que diz que quando o Espírito Santo vem, duas coisas acontecem. Uma delas é que o cenáculo foi aberto e os discípulos saíram para pregar, e o outro elemento importante, ao qual nem sempre damos a devida atenção, é que as pessoas os ouviram e os entenderam em seu próprio idioma. A presença do Espírito Santo torna possível pregar, mas também ser compreendido, e isso é algo que deve nos fazer pensar muito como Igreja hoje.

Nós pregamos, mas será que as pessoas nos entendem? A questão da linguagem é fundamental, uma Igreja sinodal que escuta, tem que abrir os olhos para a linguagem do povo, para a narrativa, para os exemplos, para os tempos. Uma pastoral digital não olha apenas para as coisas que temos que colocar nas redes, mas tem que nos ensinar uma nova maneira de fazer a homilia, uma nova maneira de dar catequese aos nossos filhos, uma nova maneira de fazer pastoral na vida concreta, de falar com eles em uma linguagem que as pessoas possam nos entender, em momentos em que as pessoas possam nos escutar.

Se falamos e ninguém nos entende, por que pregamos? O chamado à nossa porta que a missão digital faz é prestar atenção em como, ao mudar a linguagem, você também pode alcançar as pessoas novamente, pode alcançar pessoas que não nos ouviram antes e pode fazer com que as pessoas continuem a nos seguir. E vimos muito isso na pandemia, como as pessoas aprenderam a buscar pregações que tocam o coração, que tocam a inteligência, que fazem sentido. Isso deve nos fazer refletir um pouco sobre nossa pregação, sobre nossa linguagem, sobre a maneira como comunicamos a fé ao nosso povo.

E olhando para o futuro, quais são as perspectivas, as possibilidades que essa missão digital abre para a Igreja?

O desafio importante é unir todo esse movimento mais carismático, que são os influenciadores, os missionários digitais, uni-los à vida institucional da Igreja, fazer uma ponte entre o missionário digital e os bispos, de modo que, embora mantendo o fluxo e a vitalidade carismáticos, eles também entrem em uma vida institucional que possa ajudar a organizar a vida da Igreja na era digital. Uma realidade paralela entre instituição e carisma, nunca pode dar frutos.

A instituição e o carisma sempre têm que caminhar juntos, o desafio é encontrar as maneiras pelas quais isso pode dar frutos. Neste momento, além da formação, a liberdade para a responsabilidade, porque o trabalho em rede também tem seus perigos, seus riscos, então temos que formar cada pessoa em liberdade para saber viver nesses ambientes. O outro grande desafio é conseguir unir instituição e carisma.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

quinta-feira, 25 de julho de 2024

No Brasil, nem todas as vidas têm o mesmo valor

 

A apresentação do Relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2023, realizada pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), na segunda-feira 22 de julho, em Brasília, mostra que no Brasil, nem todas as vidas têm o mesmo valor. Os números relatam o aumento dos assassinatos, que em 2023, chegaram em 208, da morte de crianças menores de 04 anos, que chegou em 1040, com 670 que poderiam ter se evitados, dos suicídios, que foram 180.

Os povos indígenas no Brasil têm sido historicamente massacrados, quase sempre com a cumplicidade do Estado, que não faz respeitar os direitos garantidos na Lei Suprema do país. Os ataques contra os povos indígenas se tornaram uma constante, e essa violência não pode ser tolerada, ainda menos naturalizada. O poder público não reage, a sociedade permanece indiferente, e poderíamos dizer que os indígenas se tornaram para grande parte do povo brasileiro cidadãos de segunda categoria.

A Igreja católica, mesmo sabendo que tem católicos com essas atitudes que acabamos de dizer, tem se empenhado, especialmente através do Conselho Indigenista Missionário, no acompanhamento e defesa dos povos indígenas. Uma defesa que não pode ser ignorada, pois são os povos originários aqueles que melhor cuidam da obra criadora de Deus. Se nós dizemos acreditar no Deus Criador, não podemos ignorar àqueles que melhor cuidam daquilo que Deus colocou ao dispor da humanidade, de toda a humanidade.



Defender a vida tem que ser uma obrigação sempre para quem se diz cristão, e o empenho nessa defesa tem que ser durante toda a vida e em favor de todos. Somos desafiados a nos posicionarmos contra qualquer tentativa de desrespeito para com a vida, especialmente para com a vida dos pequenos, daqueles que são descartados, atacados porque são considerados um empecilho pelo poder político e econômico, que tem no lucro seu objetivo fundamental.

O Relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2023, vai relatando com detalhe os diversos tipos de violência: Contra o Patrimônio; Contra a Pessoa; por Omissão do Poder Público; Contra os Povos Indígenas Livres e de Pouco Contato. Os números não podem ser ignorados, mesmo que muitos se empenhem em disfarçá-los, em dizer que não é bem assim. Mas são números que recolhem dados objetivos, colocando em evidência a crueldade com que os povos indígenas são tratados no Brasil.

A febre da ganância não pode falar mais alto do que a defesa da vida, a vida dos povos indígenas não pode ficar subjugada aos interesses económicos de pequenos grupos de poder, amparados pelo poder político. Somos desafiados a escolher o lado, a assumir a causa indígena como sociedade, como Igreja católica. Se a gente não tem claro isso, se ignoramos essa defesa, estamos nos afastando do conceito de humanidade, mas também estamos nos afastando de Deus.

Devemos lutar para que todas as vidas tenham o mesmo valor, para que as injustiças e preconceitos, secularmente presentes na sociedade brasileira fiquem para trás, para nunca duvidar do valor da vida, de cada vida, de todas as vidas, especialmente da vida dos pequenos, daqueles que muitos querem descartar, mas que sempre foram e serão os prediletos de Deus.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1 - Editorial Rádio Rio Mar

terça-feira, 23 de julho de 2024

Dom Ionilton a caminho de sua nova missão como bispo da Prelazia do Marajó


Dom José Ionilton Lisboa de Oliveira, depois de ter se despedido de Itacoatiara na tarde desta terça-feira, está a caminho de sua nova missão na prelazia do Marajó, estando prevista sua chegada em Soure, sede da prelazia, na quinta-feira, 25 de julho. O bispo da prelazia do Marajó, nomeado pelo Papa Francisco no dia 03 de novembro de 2023, iniciará sua missão na celebração que acontecerá no sábado, 27 de julho, às 19 horas, onde se espera a presença do núncio apostólico no Brasil, dom Giambattista Diquattro, de bispos, padres, representantes da Vida Religiosa e do laicato do Regional Norte1, assim como do Regional Norte2 da CNBB.

Nos últimos dias aconteceram diversas celebrações de ação de graças na prelazia de Itacoatiara, onde iniciou sua missão no dia 20 de julho de 2017. Dom Ionilton teve o serviço como marca e identidade, segundo o pároco da Catedral Nossa Senhora do Rosário e coordenador de pastoral, padre Acácio Rocha, que, diante de sua nomeação como bispo da prelazia do Marajó, lembrou as palavras de dom Ionilton, que sempre disse ao clero de Itacoatiara: “não fomos ordenados para nós mesmos, fomos ordenados para o serviço da Igreja, e onde a Igreja precisar devemos estar disponíveis para colaborar com a missão da Igreja”.



Em nome da prelazia, o coordenador de pastoral expressou “nossa gratidão pelo seu serviço pastoral e missionário em nossa prelazia de Itacoatiara”, destacando o cuidado com a vida e seus direitos que o bispo fez ao longo de quase sete anos. Ele foi relatando o que foi feito por dom Ionilton em sua missão episcopal na prelazia, que definiu como “um testemunho vivo do amor de Cristo e do poder transformador do Evangelho”. afirmando que “suas ações, gestos e palavras deixam uma marca indelével em nossas mentes e em nossos corações”, e pedindo a benção da Virgem do Rosário em sua nova missão.

Dom Ionilton, com grande emoção, agradeceu o tempo em que tem pastoreado a Igreja de Itacoatiara, dizendo ter feito todo seu esforço para assumir seu lema episcopal: “Estou no meio de vocês como aquele que serve”. Reconhecendo os erros e pedindo perdão por eles, agradeceu aos leigos e leigas das 13 paróquias e mais de 250 comunidades, que abraçaram a missão evangelizadora na prelazia; aos ministros ordenados, “que me acolheram, me animaram a viver a missão”; aos seminaristas; à Vida Consagrada. Ele lembrou algumas frases pronunciadas no dia do início de sua missão em 30 de julho de 2017, analisando os passos dados nesse tempo.



Ele pediu evitar falar mal do novo bispo que a prelazia de Itacoatiara irá receber, nem que o trabalho do novo bispo seja comparado com o que ele fez, pedindo à Igreja de Itacoatiara que acolham e observem as orientações do novo bispo, e ao clero que “não deixem navegar sozinho ao novo bispo nas água da nossa prelazia”. Igualmente, pediu a todos aqueles que fazem parte da prelazia que cuidem dos pobres, em quem Jesus está. Ele fez um convite a amar, dizendo que “o amor é a senha que abre a porta do céu”.

Pouco antes de sair da prelazia, dom Ionilton lembrou que “nossa Igreja é missionária por natureza”, e que, depois de sete anos em Itacoatiara a Igreja lhe chama para ser missionário em outra parte da Amazônia, onde disse ir confiante, porque é missão, dizendo querer abraçar com entusiasmo a nova missão que a Igreja lhe confia. Para a prelazia de Itacoatiara, ele pediu a benção de Deus, agradecendo a todas as pessoas que caminharam com ele, pedindo que “lutem pelo Reino de Deus, lutem pela defesa da vida, lutem pela justiça, lutem pela paz, sejamos cada vez mais solidários, especialmente com quem mais precisa”.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

segunda-feira, 22 de julho de 2024

Inicia Curso de Realidade Amazônica em Manaus, “para começar o processo de integração nesta terra”


A Faculdade Católica do Amazonas, em parceria com o Regional Norte1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB Norte 1), a Comissão Episcopal da Amazônia (CEA) e em comunhão com a Rede Eclesial Panamazônica (REPAM), realiza no Centro de Formação de Lideranças da Arquidiocese de Manaus, Maromba, de 21 de julho a 04 de agosto, o Curso de Realidade Amazônica.

São 23 participantes, procedentes de diversas regiões do Brasil e de diferentes países da África, da Ásia, da América Latina e da Europa, que irão trabalhar na arquidiocese de Manaus, nas dioceses de Alto Solimões, Parintins e Roraima, e na prelazia de Tefé: 12 religiosas, uma leiga, dois leigos e sete padres.

“Ao mesmo que é uma tradição antiga, já é uma história longa, ele foi iniciado em 10991, mas cada ano tem sido uma renovação. Pelo grupo que chega, que vem sempre de lugares diferentes, de lugares mais distantes”, segundo a professora da Faculdade Católica do Amazonas, Elisângela Maciel, coordenadora do curso. A experiência dos anos passados ajuda a trocar conteúdos, ampliar e intercalar questões.



No grupo deste ano, o grupo maior, de diferentes congregações, irá trabalhar em diversas localidades da prelazia de Tefé. Alguns deles já tem alguns meses na Amazônia, “mas com esse anseio de fazer a missão, de abraçar a região”, salienta a professora. Diante disso, ela afirma que “a proposta do curso é aprofundar isso que eles já trazem, esse chamado que eles já trazem, e dar esse subsídio, dar essas ferramentas necessárias para que eles possam atuar da melhor maneira, com esse conteúdo, mas também com algumas práticas que a gente vai trocando ao longo do curso com atividade pastoral”, na área ribeirinha e na periferia de Manaus.

Se trata de dar “experiências diferentes, ao mesmo tempo que dar um conteúdo cada vez mais aprofundado para que eles possam depois utilizar nas diversas realidades que eles vão enfrentar”, afirma Elisângela Maciel. Um dos participantes do curso é o voluntário leigo Marista, Pedro Figueiredo, chegado de Porto Alegre (RS), que mostra sua importância para “conhecer a Amazônia, um pouco da Amazônia, um pouco dos elementos da cultura da Amazônia, para começar o processo de integração nesta terra”.

O curso busca formar agentes de evangelização a serviço da vida na Amazônia, desde a encarnação na realidade. Um espaço formativo de acolhida, reflexão e aprendizados para o serviço missionário na região amazônica. Se oferece “um conjunto de informações mais sistematizadas sobre a própria região amazônica, concentrando sua reflexão sobre o humano, o meio ambiente, a vida e a ação evangelizadora da Igreja”.



A partir de uma metodologia sinodal, decolonial e intercultural, se estuda a realidade socioambiental, político-econômica, cultural e eclesial da Amazônia, buscando elaborar com os agentes um instrumental teórico-metodológico, necessário para o conhecimento e inserção na realidade. À luz da fé, o curso quer descobrir propostas concretas de ação libertadora e encarnação na realidade, e junto com isso estreitar a comunhão com as Igrejas, povos e culturas da Pan-amazônia, numa visão mais ampla desta vasta região. Igualmente, o curso quer abrir-se ao grande patrimônio espiritual dos povos da Amazônia e sua pluralidade.

O curso será realizado numa metodologia participativa, e está destinado a agentes de pastoral inseridos nas comunidades eclesiais e serviços pastorais na região amazônica; a leigos e leigas, religiosas e religiosos, presbíteros, diáconos vindos de outras regiões para servir na Amazônia, atores sociais envolvidos com as questões amazônicas.

Ao longo do curso será feito uma análise de conjuntura abordando diversas realidades; uma abordagem da antropologia e geografia amazônica; a história, cultura e sociedade da Amazônia; a espiritualidade e vozes da Amazônia. Junto com a parte teórica, os participantes do curso realizarão uma experiência pastoral nas comunidades.



Na missa de abertura, o padre Cândido Cocavelli, diretor administrativo da Faculdade Católica do Amazonas, fez um chamado a ser atraídos por Jesus, por sua palavra, por seu ensinamento, que tocam, transformam vidas e atraem, a exemplo de Maria Madalena, no dia em que a Igreja celebra sua festa. Seguindo as palavras de dom Hélder Câmara, definiu os missionários e missionárias como homens e mulheres de fronteira, chamados a lançar seu olhar na realidade do mundo para enxergar no rosto do povo o rosto do Crucificado, numa Amazônia onde há muitos crucificados, que precisam ser descidos da Cruz.

Ele disse aos participantes do Curso de Realidade amazônica que não podemos nos tornar insensíveis diante da vida que é espoliada, que é tirada, numa Amazônia onde está sendo desfigurada a obra do Criador, por aqueles que exploram, que devastam, que ceifam vidas, poluindo os rios, destruindo a natureza e a vida das pessoas. Junto com Madalena, fez um convite a ser anunciadores da Ressurreição, se tornar novas criaturas. Igualmente falou sobre a necessidade de reconhecer a presença feminina na Igreja, a relevância do trabalho das mulheres, mas sobretudo a maternidade, enxergar no rosto das mulheres uma Igreja que não mede esforços para servir: catequistas, ministras, que sustentam a vida de fé de tantas comunidades no interior e nas periferias das cidades da Amazônia.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Cimi lança o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil: “Assumirmos a causa indígena como a causa da Igreja”


O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) lançou nesta segunda-feira, 22 de julho, na sede da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Brasília, o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil – dados de 2023. São 305 povos indígenas no Brasil, com 116 registros de povos em isolamento voluntário, cada vez mais vulneráveis, diante da lógica que coloca o lucro acima da vida.

Falta de direitos e de demarcação

O lançamento, que foi iniciado com um ritual indígena e denúncias da falta de direitos e da toma de providências das autoridades no Mato Grosso do Sul, algo que se agrava diante da falta de demarcação das terras,  contou com a presença do arcebispo de Manaus e presidente do Cimi, cardeal Leonardo Steiner; do secretário executivo, Luis Ventura; dos organizadores do relatório, Lucia Helena Rangel e Roberto Antônio Liebgott; da cineasta e antropóloga, Ana Carolina Mira Porto; e dois representantes dos povos indígenas: o cacique na Terra Indígena (TI) Caramuru – Catarina Paraguassu, no sudoeste da Bahia, Nailton Muniz, Pataxó Hã-Hã-Hãe, e a liderança Avá-Guarani do tekoha Y’Hovy, na TI Tekoha Guasu Guavirá, no oeste do Paraná, Vilma Vera.

O Relatório, organizado em três capítulos e 19 categorias de análise, apresenta um retrato das diversas violências e violações praticadas contra os povos indígenas em todo o país, acontecidas em 2023, o primeiro ano do terceiro mandato do Governo Lula, que ofereceu poucos avanços na questão indígena. De fato, a violência contra os povos indígenas no Brasil continua, segundo recolhe o Relatório.



Grito de denúncia para visibilizar a realidade

Daí a importância deste “grito de denúncia, que pretende dar visibilidade à situação e à realidade nos territórios indígenas, e é um grito de denúncia e é um anúncio também da resistência dos povos indígenas”, segundo Luis Ventura. “Um documento que pretende instigar e exigir àqueles que tem responsabilidades para que tomem as medidas de forma urgente para enfrentar essa violência permanente e estrutural contra os povos indígenas”, salientou o secretário executivo do Cimi.

“Os povos indígenas são testemunha viva da ousadia, da perseverança da luta”, disse o cardeal Steiner. Ele denunciou como ao longo da história do Brasil “os povos indígenas foram caçados, em seguida escravizados, em seguida defendidos pelos padres jesuítas”, relatando exemplos disso, “e através da história toda do Brasil, sempre os povos indígenas foram sendo massacrados”, enfatizou o presidente do Cimi, que denunciou a morte, destruição de culturas, o desaparecimento de línguas. Ele insistiu em “levar adiante essa verdadeira missão que nós recebemos de assumirmos a causa indígena como a causa da Igreja”.

Dom Leonardo Steiner disse que vivemos “um momento extremamente difícil, porque o Congresso Nacional perdeu o horizonte da ética, mas perdeu pior, perdeu a moral, porque se acha que se pode impor aos povos indígenas determinadas leis, esquecendo de que há justiça que possibilita a lei. É o direito, é a justiça, e a justiça não condiz com as leis que estão sendo gestadas e todas as tentativas que têm acontecido no Congresso Nacional”, enfatizando que a Igreja católica está junto dos povos indígenas. Um relatório que se comprometeu a entregar às autoridades brasileiras ao Papa Francisco, “como testemunho de um serviço que a Igreja presta no Brasil”.



Negação e violação dos povos indígenas

As lideranças indígenas presentes denunciaram a negação e violação dos povos indígenas no Brasil, “que com muitas dificuldades e com muita luta o nosso povo conquistou dentro da Constituição”, disse Vilma Vera. Situações de ódio e preconceito, que levaram a liderança indígena a perguntar “até quando o Brasil vai assistir esse massacre? Até quando a justiça brasileira vai oprimir a população indígena, criando e aprovando leis totalmente contrárias à legislação? Até quando vamos ter que perder nossos parentes?”, pedindo que a justiça cumpra com seu papel, e que a sociedade brasileira lhes ajude, que o Brasil pare de lhes matar, que evite a morte dos indígenas, inclusive crianças, que eles têm seu direito ao território e como seres humanos.

Nailton Muniz, que entrou na liderança indígena em 1975 relatou a violência sofrida por ele e seu povo nesse tempo, vivendo a pior situação em janeiro de 2024. Uma situação que foi relatada pela liderança indígena, que mais uma vez denunciou que “é triste viver num país que não respeita a nossa Constituição”, e os direitos que ela garante para os povos indígenas. Isso provoca preocupação nas lideranças indígenas, que demandam organização, também espiritual, para conseguir a demarcação das terras indígenas. Isso diante da morte contínua de indígenas e a falta de providências das autoridades, chegando a dizer que “o mundo da justiça está contra nós”.



Violência contra os apoiadores

Ódio e violência que também atinge os apoiadores e simpatizantes dos povos indígenas, segundo relatou Ana Carolina Mira Porto. Ela denunciou a invisibilidade da questão indígena na imprensa e a impunidade diante dos ataques que sofrem os povos indígenas e seus apoiadores. Ela falou abertamente de um genocídio em curso, que provoca mortos, feridos, muita gente traumatizada. Por isso pediu autodemarcação, justiça e disso não ao Marco Temporal que vulnerabiliza ainda mais esses povos.

No Brasil, o Congresso Nacional, deputados e senadores pretendem legislar para acabar com os direitos indígenas e incitando violência, segundo Lucia Helena Rangel. Ela mostrou que o relatório recolhe 150 casos de conflitos por direitos territoriais, 276 casos de invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio, e 850 casos de omissão e morosidade na regularização das terras, 411 casos de violência, dentre eles 208 assassinatos, e junto com isso 1040 crianças até 4 anos mortas por omissão do Poder Público e 180 suicídios.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1