A Economia de Francisco e Clara é um chamado do Papa Francisco
a repensar o atual sistema económico, a mudar a economia atual e atribuir uma
alma à economia do amanhã. Isso tem repercussões em todos os cantos do Planeta,
também na Amazônia. É por isso, que neste sábado, 27 de fevereiro, era convocado
o 1º Encontro regional da Amazônia Legal para refletir sobre essa questão.
Estamos frente a uma economia de morte, segundo Eduardo
Brasileiro, que apresentava a economia de Francisco e Clara como “uma ligação
entre instituições, conectando pontos de luta, de resistência, de alternativas
para este mundo”. Segundo o sociólogo, existe “a necessidade de buscar, de
integrar tudo o que está sendo proposto em diversos âmbitos, em práticas, a necessidade
de olhar para lugares de inspiração”. Estamos diante da oportunidade de buscar
novos modelos de economia, de educação, de busca por terra, teto e trabalho,
feito desde uma integralidade.
Segundo Brasileiro, Assis deve ser entendido “como lugar que
mostra que podem ser corrigidos os caminhos que estamos tomando”, e Francisco e
Clara tem que ser vistos “como exemplo de fraternidade, que supera a economia
da desigualdade, da injustiça”. Ao levar para a Amazônia a Economia de Francisco
e Clara, Eduardo, que faz parte da Articulação Brasileira, insiste em faze-lo “a
partir de seus povos, da cidadania e da florestania”. Ele propõe uma mudança de
lógica, “uma lógica da economia solidária frente à lógica do mercado, do
capital financeiro”, colocando alguns exemplos que mostram que isso é possível.
Isso tem que nos levar a superar a necropolitica e assumir
uma política que muda a sociabilidade, a assumir o modelo de distribuição que o
Papa Francisco fala, que hoje está marcado pela desigualdade que agride a mãe
Terra e os mais pobres. Também somos desafiados a assumir que somos
interdependentes e terradependentes. Eduardo também refletia sobre a espiritualidade
económica, sobre uma economia voltada para a vida, afirmando que “a economia
tem que começar na partilha do pão”.
Dom Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus, começava
afirmando a necessidade de “retomar a economia dos povos originários, que não é
desde o lucro e sim desde a relação, porque é partilha, é cuidado”. O desafio é
uma economia a serviço de todos, “uma economia que tem a ver com fraternidade”.
Segundo o arcebispo de Manaus, “vivemos hoje uma injustiça econômica, a
desestruturação das relações por causa de economia”, afirmando que nos
encontramos numa “verdadeira desfraternidade”.
Ele fazia um chamado a “permanecer na escuta da realidade a partir do
sentido de ser pessoa”, enfatizando que “estamos falando de uma economia de
pessoas, não de objetos, estamos falando de imagem e semelhança de Deus”.
Falar de economia, segundo o arcebispo de Manaus, é falar de
“ser casa, que é o que abriga, aquilo que se faz necessário para o cuidado e o
cultivo da nossa casa comum”, que ele não entende como estrutura e sim “as
relações que estabelecem com todos os seres”. Dom Leonardo fazia uma análise da
etimologia da palavra economia, insistindo na dimensão dos indivíduos que
convivem e das relações que cuidam da distribuição, não só das coisas, também
do cuidado das diferentes questões que fazem parte da vida. Segundo o
arcebispo, “a economia expressa um modo de ser nós”, que nos leva ao cuidado da
totalidade das pessoas e do seu mundo.
O Papa Francisco pretende, segundo Dom Leonardo, mostrar “o
valor da economia na deseconomia em que vivemos”, superando o modo de entendermos
hoje a economia como mercado, como lucro, insistindo na necessidade de
“retornarmos ao modo de ser do homem, que é cuidar”. Para o arcebispo de Manaus,
“discutir a economia significa pensar a nós mesmos, na nossa humanidade, para
não nos tornarmos desumanos”, uma questão importante hoje, em que “a economia,
ela não é mais humana, ela é do mercado, e o mercado não tem coração”.
O arcebispo de Manaus, que é franciscano, refletia sobre a
forma de entender a vida de Francisco e Clara, que guiaram sua vida pela
gratuidade, que indica não troca, não cálculo. Em relação à Amazônia, ele
refletia sobre a cobiça que existe sobre todo o que a Amazônia contém,
enfatizando que “tudo isso tira a gratuidade da Amazônia e a gratuidade dos
povos originários”. Segundo Dom Leonardo, “da gratuidade nasce a fraternidade”,
realizando uma igualdade que não seja puro nivelamento e uniformização. “Em
Francisco e Clara tudo é irmão e irmã, permanecendo na sua diferença de ser”,
afirma o arcebispo.
Dom Leonardo se perguntava por que há tanto pobre no mundo
hoje, e ele mesmo respondia que “porque não há misericórdia, porque a economia
deixou de ser economia no seu sentido etimológico”. O arcebispo afirmava que “a
força histórica do cristianismo não vem do poder, mas sim da autoridade do não
poder, do amor, dos pobres”. Nesse sentido, se questionava se não estamos
traindo o Evangelho quanto à questão económica, “porque elegemos o poder e a
força como nossa autoridade, e não o cuidado”.
Ao falar de Querida Amazônia, Dom Leonardo dizia que nela “o
Papa Francisco nos oferece um novo horizonte para a economia na Amazônia”, nos
apresentando a “economia como cuidar da casa comum”. Segundo ele, “os quatro
sonhos são quatro dimensões que nos oferecem a totalidade do modo de ser de
quem vive na Amazônia”, que nos ajuda a nos darmos conta da importância de tudo
e de todos. Cada uma das dimensões está mostrando a totalidade, o que somos
como pessoas e a casa que nos deixa ser pessoas. Na Amazônia somos tomados pela
admiração e pelo cuidado, insistindo em que “enquanto não mudar para a
admiração e o cuidado, só se vê lucro”.
Por isso se faz necessário deixar de lado a dominação, a
destruição, o lucro, o mercado, a escravidão, a expulsão e a morte. A economia
baseada no mercado, não vê as belezas da Amazônia e dos povos que nela habitam,
“é uma economia que mata”, enfatiza Dom Leonardo Steiner, e “a economia que
temos hoje em relação à Amazônia mata, perdemos a totalidade, vamos perdendo
todo, vamos perdendo nossa morada, a nossa moradia, estamos entrando no
deserto”. A Querida Amazônia, segundo ele, “pode nos ajudar a despertar e
perceber a necessidade urgente de mudar a nossa concepção de economia”, algo
que já aparece na Laudato Si, onde nos convida não a dominar e sim a assumir a
responsabilidade, ainda mais tendo em conta que nós somos destruidores.
Ao falar sobre possíveis caminhos em prol de fortalecer essa
nova economia na Amazônia, Márcia Oliveira partia da importância da proposta do
Papa Francisco que busca uma economia “mais justa, mais sustentável,
assegurando uma preeminência para as populações excluídas”. Segundo a socióloga,
o tema tem suas raízes na Sagrada Escritura, algo que é recolhido pelo Vaticano
II e retomado pelo Papa Francisco na Laudato Si´, que faz a proposta da “ecologia
integral como projeto de sociedade pensada a partir da casa comum”, tendo como
referência os conceitos de sobriedade, simplicidade e bem viver, algo que leva
a “repensar os paradigmas da sociedade capitalista e propor novos modelos”.
Na Amazônia, tudo isso foi assumido e levado à prática no Sínodo
para a Amazônia, instaurando no processo sinodal, um modo de “pensar uma Igreja
a partir de uma ecologia integral”. Marcia Oliveira que foi perita sinodal,
destacava a importância do momento de escuta, que atingiu oficialmente 87 mil
pessoas. Tudo isso foi recolhido no Documento Final do Sínodo, onde se afirma
que “é necessário buscar modelos econômicos alternativos, mais sustentáveis,
amigáveis à natureza, com ‘sólido sustento espiritual’”. Também na Querida
Amazônia, onde o Papa Francisco afirma que “libertar os outros das escravidões
implica certamente cuidar do seu meio ambiente e defende-lo”, destacando como “o
Senhor, que primeiro cuida de nós, ensina-nos a cuidar dos nossos irmãos e
irmãs e do ambiente que Ele nos dá de presente cada dia”.
Estamos, com a Economia de Francisco e Clara, segundo Márcia
Oliveria, diante de um processo que “confia aos jovens o protagonismo de uma transformação
necessária e urgente nos paradigmas da humanidade. Trata-se de uma verdadeira
revolução, não uma mera reforma”. Segundo a socióloga, “o Papa Francisco confia
aos jovens a tarefa de mudar radicalmente os rumos da humanidade”. Ela também
destacava o trabalho que Caritas Brasileira tem feito no campo da Economia
Solidária e de Convivência com a Amazônia, elementos que apontam caminhos para
a Economia de Francisco e Clara.
Nesses novos caminhos, Luis
Fernando Novoa Garzon abordava a necessidade de aprender com os povos tradicionais
o que é a reciprocidade com os outros seres. Isso é algo que, segundo o professor
da Universidade Federal de Rondônia, “se traduz no cotidiano num permanente
entendimento”. Ele insistia na importância de conhecer a mitologia dos povos
originaraios, algo que ajuda a entender que existe uma vinculação comum entre
todos os seres.
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