terça-feira, 20 de abril de 2021

A pandemia do Tráfico de Pessoas, uma realidade “invisível, disfarçada, quase imperceptível” na Amazônia


O Tráfico de Pessoas, uma realidade definida pelo Papa Francisco como mercantilização da vida, é um desafio cada maior na sociedade atual, também para a Igreja. No Regional Norte 1 da CNBB, o enfrentamento do Tráfico Humano e da exploração sexual de crianças e adolescentes tem sido assumido desde 2011 pela Rede Um Grito Pela Vida.

A pandemia da Covid-19 tem provocado um aumento dessa realidade, algo que tem sido abordado no encontro de formação organizado pela Rede um Grito pela Vida, que refletiu sobre A realidade das violações dos direitos, abuso, exploração sexual, Tráfico de Pessoas e migração em tempos de pandemia no Regional Norte 1: junto a infância, juventudes e mulheres”.

Estamos diante de uma realidade sempre presente na vida da humanidade, presente na Bíblia, onde já são narradas situações de trabalho escravo, violências, violações de direitos e migrações, segundo Francisco Lima. Não podemos esquecer que história é construída por povos que dominam outros povos, fazendo com que sempre existiu a escravidão do povo.

A escravidão ao longo da história foi permitida durante séculos, era considerada legal e normal. De fato, o Brasil foi um país construído com indígenas e negros traficados, lembrava Francisco Lima. Hoje é uma realidade mascarada, disfarçada e invisível. O Tráfico Humano é a escravidão de nossa época, a mercantilização da vida em nome do lucro, onde pessoas são consideradas mercadorias, insistia o secretário executivo do Regional Norte 1.




Na sociedade atual, uma situação que tem aumentado com a pandemia, existem circunstâncias que facilitam o Tráfico Humano. Uma delas é a miséria diante da falta de emprego ou qualquer fonte de renda, também a ganância, que faz com que as pessoas busquem ter dinheiro sem limites, sem escrúpulos, algo que inclusive acontece por pessoas conhecidas. Junto com isso, outra circunstância é a impunidade, dado que é difícil que os criminosos sejam punidos.

Estamos diante de uma realidade que é a terceira atividade mais lucrativa no mundo, que rende 32 bilhões de dólares por ano. Uma realidade da qual participam muitas pessoas, de toda condição, que é um atentado contra a dignidade da pessoa, segundo Francisco Lima. Existem diversas modalidades desse crime: mendicância, exploração sexual, adoção irregular, servidão doméstica, casamento servil, trabalho escravo, atividades criminosas, venda de órgãos, que são expressões do Tráfico Humano.

A Amazônia é uma das rotas principais do Tráfico Humano no mundo. Francisco Lima refletia sobre a situação dos ribeirinhos e indígenas nas cidades, muitas vezes nas periferias. Diante dessa realidade Jesus nos convida a acolher, dar de comer, cuidar, visitar. Ele lembrava como a Igreja tem buscado dar visibilidade e refletir essa realidade, sobretudo a partir da Campanha da Fraternidade de 2014. Em consequência disso, o Regional Norte 1 assumiu a Migração Forçada e o Tráfico de Pessoas como causa comum nas dioceses e prelazias. O Sínodo para a Amazônia, desde o processo de escuta, e Querida Amazônia, onde o Papa Francisco nos diz que “é preciso indignar-se”, tem ajudado a refletir e dar visibilidade ao Tráfico de Pessoas.




A pandemia tem aumentado a vulnerabilidade das vítimas. Nesse sentido, a realidade do interior nos mostra que existem muitos casos de gravidez precoce, de meninas de 12 e 13 anos, algo que está ajudando a conhecer o trabalho realizado pelo AJURI Amazônico. Estamos numa região onde muitas menores são forçadas a se casar, onde acontece um crescente aumento do trabalho infantil no interior e nas cidades. Na verdade, os dados são pouco conhecidos, um grande problema é a ausência de dados, também a precarização da rede de proteção e do seu funcionamento, dos CMDCAs e dos conselhos tutelares.

Diante dessa realidade somos chamados a olhar a realidade e se articular para transformar, afirmava Marcia Maria de Souza Miranda. A articuladora da Caritas Regional Norte 1, relatava as situações e dificuldades vividas neste tempo de pandemia, insistindo na necessidade de estender o olhar para o interior e trabalhar em rede. O desmonte das políticas públicas, uma realidade cada vez mais presente no Brasil, tem piorado a situação da população, relatava Márcia. Diante disso, a sociedade civil tem se organizado e garantido os direitos do povo.

Um desafio é levar as formações para o interior, onde quase não tem acesso à internet. Isso tem que levar a fortalecer as pastorais sociais, a cuidar da realidade de muitas jovens e adolescentes que para se manterem, no interior e na cidade, acabam caindo na exploração sexual e tráfico de drogas. Se faz necessário continuar animando as pessoas, para que não desanimem diante da realidade de desgoverno e os tantos desafios. É tempo de ousadia, simpatia e profetismo, de resgatar a pastoral de conjunto, para poder superar a pandemia do Tráfico de Pessoas e tantas pandemias presentes na Amazônia e no mundo. 

 


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