domingo, 5 de setembro de 2021

Dom Cláudio: “A crucificação da Amazônia desencadeia sofrimento para muitos filhos e filhas de Deus”


Muita gente se imagina a Amazônia como uma floresta sem fim, como rios de águas puras, um lugar donde os povos que a habitam vivem em paz e em harmonia. Mas na verdade estamos ante uma região onde “o desastre ambiental que alcança dimensões absurdas não pode, neste momento, ser interpretado, senão, como morte, paixão”.

Quem assim fala é o cardeal Cláudio Hummes, afirmando isso com motivo do Dia da Amazônia, que o Brasil celebra no dia 5 de setembro. Em um texto escrito pelo presidente da Comissão Episcopal Especial para a Amazônia da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), ele se questiona como celebrar o Dia da Amazônia. Baseado na psicologia, o purpurado afirma que “somente a partir do momento em que os problemas são encarados objetivamente é que se torna possível curá-los ou lidar com eles de maneira melhor”.

Dom Cláudio cita Elie Wiesel, sobrevivente judeu dos campos de concentração nazistas e Nobel da paz em 1986. Ele afirmou que “a indiferença é a raiz de todo mal. Segundo ele, é a indiferença, e não ódio, que se opõe ao amor. É ela, e não a morte, que se opõe à vida. É ela, e não a heresia, que se opõe à fé”. Daí ele conclui que “precisamos celebrar o Dia da Amazônia, embora ela esteja, talvez mais do que nunca, em sua hora de cruz”, insistindo em que “não ser indiferente exige de cada pessoa certo compromisso”.



O cardeal denuncia que “a Amazônia está ardendo em chamas por incêndios, muitos dos quais provocados intencionalmente, e pela falta de políticas públicas de combate, controle e mitigação das queimadas”. Ele cita dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), que mostram que “somente no mês de agosto foram registrados 2.228 focos de incêndio. Mais que o dobro em relação a 2020”.

Segundo o presidente da Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA), “a Amazônia está tombando sob o avanço do agronegócio, da mineração e do garimpo ilegal, e minguando aceleradamente em hectares de floresta em pé”. Ele denuncia o avanço dos projetos do chamado “desenvolvimento”, “especialmente com a fragilização da fiscalização ocorrida nos últimos anos e com o desmonte de órgãos e políticas de salvaguarda socioambientais”.

O cardeal augura um cataclismo anunciado, sustentando sua opinião no recente relatório que vaticina um aumento da temperatura global. Ele também denuncia o agronegócio, que tornou lucro o cultivo de alimentos, envenenando “os alimentos e, por conseguinte, a terra, as águas e os ares”, um modo de produção que “além de desrespeitar a natureza, acaba produzindo fome e miséria”, denunciando o avanço da monocultura no Brasil, que tem como foco a exportação, nas custas da “nossa água, nossas florestas e toda a biodiversidade que morre com a chegada do agronegócio”.



A crucificação da Amazônia desencadeia sofrimento para muitos filhos e filhas de Deus”, denuncia Dom Cláudio. Ele insiste em que “os povos indígenas estão sob o risco de perder o direito de posse aos seus territórios já tão invadidos. Aos ribeirinhos restam rios secando e águas poluídas pelos agrotóxicos e rejeitos da mineração”. Uma realidade constatada pelo papa Francisco em Laudato Si’: “o ambiente humano e o ambiente natural degradam-se em conjunto”.

No Dia da Amazônia, o presidente da Comissão para a Amazônia faz um chamado a ser realistas e esperançosos. Isso se sustenta no fato de que “no meio da noite mais escura que a luz da ressurreição se impôs”, e que “foi atravessando o deserto que nossos pais na fé chegaram à terra prometida”. Daí afirma que “há que se ter esperança, e há também que se enveredar na construção de modelos sustentáveis de produção, consumo e economia”.

Dom Cláudio convida a celebrar o Dia da Amazônia “atentos à destruição atual”, insistindo em que “esse olhar objetivo deve nos engajar na luta pela preservação e no cuidado com a Amazônia e com a Casa Comum”. Também faz um chamado a realizar “pequenos gestos simbólicos, como plantar uma árvore, revitalizar o jardim de casa ou buscar informações sobre como e onde são produzidos os alimentos que compartilhamos nas mesas de nossas casas”. Sinais que nos levam a “afirmar com certeza que a querida Amazônia, vivendo, agora, a paixão, tão logo verá essa morte transformada em ressurreição”.


Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte 1


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