Lembrando que o Evangelho do 1º Domingo da Quaresma pedia conversão: “Convertei-vos e crede no Evangelho!”, o cardeal Leonardo Steiner disse que “a conversão no segundo domingo da quaresma se torna transfiguração. Não mais figuras, mas ser ouvinte do Filho amado do Pai que nos transfigura: a transformação que a fé oferece”.
O arcebispo de
Manaus disse que “nos encanta e causa admiração o Evangelho ouvido; quase nos
espanta a primeira leitura”. Ele destacou que “a transfiguração de Jesus no
alto da montanha desperta em nós a admiração pela comunhão de Jesus com o Pai e
a plenitude dos tempos no diálogo de Moisés e Elias; a fé que na cruz chega à
plenitude. O sacrifício de Isaac comove as nossas entranhas e vemos a solidão
abraâmica a subir o monte Moriá na busca de realizar a vontade incompreensível
de Deus; transformação pela fé”.
Analisando o texto do Evangelho, Dom Leonardo ressaltou que “antes da subida ao monte e a transfiguração, Jesus anuncia a sua morte violenta e convida os discípulos a renunciar-se a si mesmos, a tomar a cruz e a segui-lo no caminho de amor e de entrega gratuita da vida (cf. Mc 8,31-38). O caminho da cruz torna os passos dos discípulos mais lentos, os corações pesados, o ânimo desalentado. Os sonhos do novo reino, da vida nova, da libertação, somem e são tomados pelo fracasso do seguimento; os sonhos de glória, de honras, de triunfos se esvaem e se perguntam se vale apena seguir um mestre que oferece a cruz como liberdade e libertação”.
Seguindo o texto, onde aparece que “Jesus
toma três dos discípulos e sobe a montanha. Era necessário
retirar-se, subir e subir, para perceber o mistério transformativo da cruz, do
seguimento na cruz”, o cardeal destacou que “conduziu-os para o alto de uma
montanha. Montanha lugar do encontro, da revelação, das manifestações de Deus;
da transfiguração: as roupas ficaram brilhantes e brancas; Elias e Moisés conversam com
Jesus. Não
mais palavras, não mais figuras, mas o que há de vir, o ‘por vir’ no mistério
da cruz e da ressurreição. Os santos padres leram a transfiguração como a
realidade que estava por vir: a dor, o sofrimento, a cruz, a morte”.
No texto aparece que Elias e Moisés estavam a conversar com Jesus. Segundo o presidente do Regional Norte1 da CNBB, “em Elias vemos todos os profetas, todo os enviados e mensageiros de Deus. Elias o recordador das fontes, do amor primeiro. Elias a conversar, isto é, fazer presença a realização das promessas, a indicar a fonte das fontes, o iniciador do novo Israel. Moisés, o libertador, o condutor, o intercessor do povo, o caminhador do deserto rumo a terra da promessa. Ele a conversar, a dizer, a indicar o Reino único e universal, o mandamento novo e eterno; Jesus o libertador o legislador do amor. Moisés e Elias os indicadores e iluminadores de um novo tempo, recordadores da fé do Povo de Deus”.
Dom Leonardo
lembrou o comentário de Atanásio do Sinai na homilia da transfiguração, que vê a
Transfiguração como lugar “onde no coração tudo é tranquilo, sereno e
suave; onde se vê a Cristo, Deus; onde Ele, junto com o Pai”. Uma atitude de
Pedro que, segundo o cardeal, também nós diríamos: “verdadeiramente é bom para
nós estarmos aqui com Jesus e aqui permanecermos pelos séculos dos séculos!”
Seguindo com a
análise do texto, que diz “e uma nuvem os encobriu…”, o cardeal disse que “a
presença de Deus na nuvem que acompanhou o povo nos anos do deserto ali está e
dela nasce a palavra: ‘Este é o meu Filho amado. Escutai o que ele diz!’ A
cruz, a morte o transformará: ouvi-o; a morte, a ressurreição o transfigurará:
ouvi-o. Ouvi-o sempre em todos os caminhos. O Filho amado, querido, a pupila
dos olhos do Pai: ouvi-o”.
Diante desse
chamado, Dom Leonardo afirmou que “talvez, não tenhamos purificado nossos
ouvidos para ouvi-lo”. Ele questionou: “Como ouvir o sofredor? Como ouvir o
condenado, o supliciado, o açoitado? Como ouvir o coroado de espinhos, o
carregante da cruz, o Crucificado? Como ouvir o pendido da cruz do qual escorre
sangue e água?” Perguntas que lhe levaram a destacar que é “tão difícil ouvir
este Amado Filho que convida a trilhar o caminho da conversão, do diálogo, sem
medos e sem receios, na fé. Ouvir a força de uma presença que pode ser
escutada; ouvir o vigor de quem passou pela morte e agora vive. Sim escutar o
Filho amado do Pai”.
“Essa
transformação, a transfiguração, a primeira leitura indica como caminho da fé”,
segundo o arcebispo. Ele destacou que “Abraão recebe a visita de Deus que lhe
pede: ‘Toma teu filho único, Isaac, a quem tanto amas, dirige-te à terra de
Moriá e oferece -o aí em holocausto sobre um monte que eu te indicar’ (Gn 22,2)”.
Ao elo do texto, ele disse que “movido pela fé, sobe o monte Moriá para o
sacrifício do filho Isaac. Moriá Deus presente! Vemos Abraão colocar-se a
caminho, com o coração inquieto, sofrido, ferido, incompreendido, mas não
desesperançado. Abraão fica só, solitário. De novo é em tudo e por tudo como o
homem quando deixou a sua terra e sua casa pela primeira vez. Abraão tinha
abandonado tudo e se tinha posto a caminho da promessa, agora, na quase
plenitude de sua vida, pode retornar a viver no mundo em que vivia já antes.
Exteriormente, tudo permanece como no passado. Mas, o passado passou, e tudo
foi feito novo. Sobe até a presença de Deus para oferecer o filho da velhice, o filho da
promessa. Tudo precisou se provado na fé”, inspirado nas palavras de Dietrich
Bonhoeffer.
Isso porque “caminha como caminha o homem da fé: busca fazer a vontade
de Deus!”
O cardeal Steiner
insistiu que “Abraão voltou para casa, mas não era o mesmo”. Ele disse que “somos
neste domingo convidados a entrar na sintonia da fé: a cruz, a morte. Em tudo
como transfiguração, uma vida que pode desabrochar”. Ele lembrou as palavras de
Kierkegaard falando sobre a fé, dizendo que “a quaresma como
caminho da fé, nos provoca a uma transformação. Uma transformação nas nossas
relações: ‘Vós sois todos irmãos e irmãs’. Jesus anunciou a vida para
todos. Todos transformados na vida do Reino, todos transfigurados na cruz e
ressurreição. Na cruz e ressurreição todos são irmãos e irmãs. Para Jesus não
existem inimigos”, lembrando as palavras do Evangelho de Mateus que nos falam
do amor aos inimigos.
O cardeal questionou se somos “Todos irmãos e irmãs, por que essa violência, essa agressão entre nós, nas comunidades, nas famílias, na nossa sociedade? Porque essa imaturidade, essa superficialidade, relacional onde nos agredimos e nos distanciamos por motivos ideológicos, políticos e até religiosos?”. Diante das perguntas, ele disse que “Jesus veio anunciar o Reino novo, o da graça, o da verdade, da justiça e da paz”, se perguntando: “Porque não conseguimos nos escutar, respeitar. Porque quase tudo precisa ser na agressão, na violência?”, respondendo que “o Evangelho nos ensina que a misericórdia, a bondade, o perdão e a compaixão como fundamento das nossas relações. Deus criou todos os seres humanos iguais nos direitos, nos deveres e na dignidade, e os chamou a conviver entre si como irmãos e irmãs”, palavras inspiradas no encontro entre Papa Francisco e Ahmad Al-Tayyeb. Por isso, o cardeal pediu que “despertemos para a beleza e a grandeza da fraternidade. Vamos fortalecer os vínculos da amizade social, para que a paz seja uma realidade entre nós, na sociedade, entre os povos”.
Finalmente, citando as palavras de Paulo aos romanos: “Se Deus é por nós quem será contra nós? Deus que não poupou seu próprio Filho, mas o entregou por todos nós, como não nos daria tudo junto com ele?”, ele disse que “ao vermos hoje Jesus transfigurado e Abraão devolvido à sua casa com o filho da promessa, percebemos ainda mais que o tempo da quaresma nos pede: caminhar na fé. Não nas nossas certezas, mas no saber do não-saber da fé”. Ele pediu, seguindo as palavras do Salmo: “Andarei na presença de Deus junto a ele na terra dos vivos”, que “andemos sempre na presença de Deus que é a terra dos vivos. Talvez tenhamos a graça de sermos também nós os videntes de Deus e por Ele transfigurados. Deus seja louvado e bendito para sempre!”
Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1
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