Foi dada a conhecer a carta do Simpósio Povos Indígenas, r-existência
às políticas neoliberais na Amazônia, onde recolhe os debates acontecido em um
encontro realizado nos dias 27, 28 e 29 de abril de 2022 em Manaus, que teve
como objetivo “pensar, discutir e propor estratégias urgentes e necessárias
para o bem viver dos povos e o desenvolvimento verdadeiro da Amazônia, não exploratório
como vem acontecendo”
No encontro participaram representantes de diferentes organizações
indígenas e movimentos sociais, contando também entre os organizadores com a Caritas
Arquidiocesana de Manaus e o Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação
Socioambiental - SARES.
A carta denuncia a “devastação da Amazônia por vários
ângulos e em todas as direções”, afirmando que “os povos originários nesse país
chamado Brasil, ainda não conseguiram ter de volta sua autonomia e seus
direitos constitucionais assegurados pelos entes públicos federais”, pois uma
coisa é o que está escrito e outra a prática.
A carta fala sobre as temáticas das mesas redondas
realizadas e o que foi discutido nos grupos de trabalho, buscando “discutir
diretrizes e ações em defesa do bem-viver, que geraram propostas sobre Participação
e Consulta Prévia Livre e Informada, Formação e Mobilização, Planos de Vida e
Sustentabilidade, Saúde, Territórios Indígenas, Educação, e Juventude Indígena.
O texto da carta recolhe as ações concretas para cada uma
das propostas, dizendo que foi indicada uma comissão para acompanhar essas
demandas e mobilizar as instituições indígenas e indigenistas para concretizar
esses objetivos, colocando os nomes daqueles que fazem parte dessa comissão.
CARTA
DO SIMPÓSIO POVOS INDÍGENAS, R-EXISTÊNCIA ÀS POLÍTICAS NEOLIBERAIS NA AMAZÔNIA
Nas últimas décadas, estamos assistindo à devastação da Amazônia por vários ângulos e em todas as direções. São ambientais, culturais, sociais e político-jurídica. Tudo está sendo queimado, as leis que garantem nossos direitos à vida devastado em cada espécie da flora, da fauna, pessoas, práticas culturais e conhecimentos próprios que estão desaparecendo.
Passados
mais de 500 anos do início do processo colonizador civilizatório, os povos
originários nesse país chamado Brasil, ainda não conseguiram ter de volta sua
autonomia e seus direitos constitucionais assegurados pelos entes públicos
federais. A Constituição Federal de 1988, reconheceu os direitos territoriais,
sociais e políticos conforme seus usos e costumes, suas línguas e autonomia.
Mas não é o que se vê na prática.
Diante desse cenário, foi realizado nos dias
27, 28 e 29 de abril de 2022, em Manaus, o Simpósio Povos Indígenas,
r-existência às políticas neoliberais na Amazônia, que teve como objetivo
pensar, discutir e propor estratégias urgentes e necessárias para o bem viver
dos povos e o desenvolvimento verdadeiro da Amazônia, não exploratório como vem
acontecendo diante dos projetos de lei 191/2020 sobre mineração em terras
indígenas e 490/2007 marco temporal e das políticas neoliberais que ferem os
Direitos Indígenas.
O simpósio foi organizado pela Cáritas
Arquidiocesana de Manaus, Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação
Socioambiental - SARES, Grupo de Estudo e Pesquisas em Educação Escolar
Indígena e Etnografia - Universidade do Estado do Amazonas - UEA, Laboratório
Dabukuri - Universidade Federal do Amazonas - UFAM, Conselho Indigenista
Missionário - CIMI, Fórum Estadual de Educação Escolar e Saúde Indígena do
Amazonas - FOREEIA, Rede Eclesial Pan-Amazônica - REPAM. O evento contou com a
participação de 99 pessoas e 56 instituições indígenas e não indígenas, a
saber: AIKIRA, AIMEAM, AIMM, AIRM, AIUE, AKGV, AKIM, Aldeia Gavião, Aldeia
Soares, Aldeia Tururukari-uka, Aldeia Cípia, Aldeia Miratu, AMARN, AMISM,
APTRQAM, Art’s Regionais, ASPANA, ASPIARA, ASPTEAM, Maloca Bayaroa, CAPSOL,
Ineamanatã, Jurupari, Karuara, Liderança Jovem, Lua Verde, MEIAM, MSE AÇÃO/RB,
Mukuura Baré, Mura Parque das Laranjeiras, Nova Vida, Onça Pintada, OSBAV,
OSPINA, Paroquia São Pedro, Pastoral do Migrante, São João Tupinambá, São
Mateus, Uryry, Waikiru, Watchimauco, Watyamã, Yupirunga, Cáritas, CIMI, CIR,
CMM, FOREEIA, MAKIRA ETA, PGE/AM, Rede Biribá, Sares, Seminário São José, UEA,
UFAM, Secoya.
Durante
o evento foram realizadas três mesas redondas, que tiveram as seguintes
temática: i) Povos Indígenas e Defesa do Bem-Viver: Violação de Direitos Meio à
Devastação Jurídica da Amazônia; ii) Povos Indígenas e Defesa do Bem-Viver em
Meio as Multidevastações da Exploração Mineral nas Terras Indígenas na
Amazônia; iii) Povos Indígenas e a Defesa do Bem Viver: Buscando Caminhos para
o Direito à Cidade. Após cada mesa redonda foram realizados grupos de trabalho
para discutir diretrizes e ações em defesa do bem-viver, que geraram as
propostas sistematizadas abaixo:
Participação
e Consulta Prévia Livre e Informada
·
Quando forem ser indicados indígenas para
ocupar cargos no legislativo e executivo é necessário observar o perfil dos
candidatos. Só podem ser indicadas pessoas que não se corrompam, tenham
comportamento transparente, bom diálogo e comunicação com o movimento indígena
e estejam comprometidas com causas coletivas.
·
Garantia de vagas para indígenas em todas
as instituições do executivo e legislativo.
·
As comissões especiais que tratam de
assuntos indígenas na Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas e nas
Câmaras Municipais devem sempre contar com representação dos povos indígenas em
todas as instituições.
·
Essencial que os povos indígenas sejam
consultados de forma prévia, livre, informada, adequada e de boa fé frente a
todos as medidas que afetem suas vidas ou territórios. Toda medida
administrativa ou legislativa a gente tem direito de se apropriar, pedir mais
informação e deve ser feita a consulta. Políticas que vem de cima para baixo,
que vão contra a nossa vontade, temos direito de derrubar.
Formação
e Mobilização
· - Mobilização e união e reivindicação
contínua é sempre necessária, um meio de conquistar nossos direitos e
objetivos.
· - Existem os programas de governo que
deveriam implementar políticas públicas, e temos que formar nossas lideranças
para fiscalizar os orçamentos e colocar lideranças em postos estratégicos.
· - Necessário promover a formação sobre às
lideranças de forma contínua e imediata sobre os direitos indígenas e
estratégias de reivindicação, especialmente sobre a constituição e convenção
169 da OIT.
· - Elaboração de cartilhas sobre os direitos
dos povos indígenas, que devem ser veiculadas para as comunidades indígenas e
para todos os órgãos públicos que trabalhem oferecendo serviços sociais aos
indígenas (educação, saúde, regularização fundiária, etc).
·
As demandas indígenas devem ser
registradas através de documentos, que devem ser enviados para os três poderes.
·
Formação de uma rede de informações com
fontes seguras, prontas para serem compartilhadas nas mídias sociais,
auxiliando o compartilhamento de informações importantes e denúncia dos ataques
aos nossos direitos e territórios.
·
Realizar intercâmbio com outros
movimentos.
Planos
de Vida e Sustentabilidade
·
É necessário criar trabalho e geração de
renda de formas sustentáveis, como psicultura e agroecologia. Essas atividades
podem gerar autonomia financeira para as necessidades das comunitárias, para
não depender de instituições externas e para evitar a saída das comunidades.
·
É necessário que as instituições possam
promover cursos nas comunidades voltados para elaboração de projetos
sustentáveis e incentivar os empreendimentos locais.
·
O Estado precisa incentivar as compras
institucionais dos produtos indígenas e que estas sejam pagas prontamente, sem
atrasos, e com os valores contratados, pois os estados e municípios estão
demorando muito para fazer os pagamentos e muitas vezes pagando menos do que o
valor combinado.
·
Realizar formação de agentes indígenas
ambientais
·
Necessário que o Estado atenda as demandas
dos artesãos referente às necessidades de coleta de sementes e outros materiais
para artesanato, principalmente em relação aos indígenas em contexto urbano,
que não tem seus territórios reconhecidos e falta a garantia de acesso à bens
naturais que permitam a reprodução cultural.
·
Outorga de Concessão do Direito Real de
Uso e demarcação de Terras Indígena aos povos indígenas de Manaus em área
próxima à cidade para extrativismo e manejo de recursos, essenciais para
garantia da reprodução cultural dos povos indígenas de Manaus e Entorno.
·
Criação de cooperativa do movimento
indígena, que consiga vender nossos produtos de uma forma que seja justa, um
empreendimento coletivo.
·
Criação de espaço cultural físico
permanente para trabalhar a cultura e a ancestralidade específica de cada povo.
Se propõe um espaço cultural-jardim botânico, uma área que envolva uma área
cultural com uma casa coletiva para prática da cultura, danças, exposições,
feiras e com área para um jardim botânico que envolva trilhas e espaço de
valorização das plantas utilizadas e nossos conhecimentos da natureza. É
necessário que seja um espaço permanente, definido coletivamente pelo movimento
indígena, que não seja modificado com as mudanças de governo. Para ter esse
espaço também precisamos cultivar a união entre todos os povos e organizações
indígenas em Manaus.
Saúde
·
Garantir a construção de UBSI direcionada
aos comunitários indígenas em todas as zonas da cidade de Manaus
·
Garantir a contratação de agentes
comunitários indígenas de saúde em todas as comunidades.
·
Reivindicar cursos de formação de agentes
comunitários indígenas de saúde para as comunidades indígenas de Manaus.
Territórios
Indígenas
·
Conscientizar os povos que as terras são
suas, com ou sem demarcação. Parentes vamos continuar pisando firme com nossa
língua e com a nossa cultura, porque a terra é nossa. A Funai não dá terra
indígena, a Funai reconhece. O ato de demarcar é um ato declaratório, quem fala
o que é terra indígena é o povo que ocupa aquela área. Pelo o fato de não ser
área demarcada ninguém pode negar a prestar serviços e continua existindo o
dever de proteção. O nosso vínculo com a nossa terra não é só de viver e
ocupar. É um vínculo espiritual, são nossas ciências, nossos conhecimentos.
·
Fortalecimento do monitoramento
territorial através do uso da tecnologia a nosso favor, estimulando o
letramento digital, desenvolvendo cursos para manuseio de ferramentas
tecnológicas, mapeamento e monitoramento por satélite, uso de drones e sistemas de comunicação.
·
Denunciar as invasões através de todos os
meios e formas.
·
Sensibilizar as comunidades sobre as
falsas promessas e riscos do garimpo e grandes empreendimentos.
·
Garantir os direitos territoriais
indígenas em contexto urbano, a partir da regularização fundiária imediata das
ocupações já existentes, respeitando a forma de regularização proposta pela
comunidade.
·
Propostas habitacionais para os povos indígenas
em contexto urbano que garanta moradias dignas e adequação urbanística e
arquitetônica de acordo com as especificidades culturais.
·
Necessidade de oferta de serviços públicos
adequados, considerando também infraestrutura de saneamento básico, lazer
·
Garantia de segurança pública, pois o
tráfico de drogas é intenso em muitas ocupações e muitas lideranças indígenas
são ameaçadas.
·
Os povos indígenas devem ter direito à
tarifa social de energia e agua
Educação
·
Lutar pela criação da Universidade dos
Povos Indígenas
·
Cobrar que o IFAM e a UFAM realizem
vestibular indígena específico e diferenciado.
·
Aumentar a cota de estudantes indígenas
nas universidades
·
Todas as línguas indígenas devem ser
reconhecidas como co-oficiais.
·
Solicitar audiência pública para a Comissão
de Educação da Câmara dos Vereadores para cobrar implementação da Educação
Escolar Indígena conforme Lei Municipal 2.781/2021 de Manaus.
·
Garantir a contração de todas as
categorias de professor indígena.
·
Garantir bolsa permanência para estudantes
indígenas no ensino superior, pelo governo Federal e Estadual.
Juventude
Indígena
·
É necessário que a juventude esteja no
movimento, para isso precisamos de um movimento mais dinâmico, com mais
interação e que garanta espaço de fala para os jovens em que eles possam expor
suas vontades no movimento.
·
Desenvolver atividades estimulantes para a
juventude indígena, para eles conhecerem desde cedo a luta. Temos que orientar a juventude, ouvir a
juventude e compartilhar responsabilidade com os jovens, assumindo cargos em
nossas instituições.
·
Implementar programas de formação de
comunicadores e articulação entre jovens influenciadores de base para que os
jovens possam engajar com o movimento indígena a partir de suas áreas de
interesse.
·
Criar Rede de Jovens Comunicadores
·
Incentivar a Juventude no desenvolvimento
de habilidades com as tecnologias digitais para defesa dos territórios
indígenas.
Foi indicada uma comissão
para acompanhar essas demandas e mobilizar as instituições indígenas e
indigenistas para concretizar esses objetivos, composta por:
Natalino Kokama - ASPIARA;
Francisco Cruz (Chiquinho Kambeba) - Tururukari-uka; Afonso Dutra - ASPITEAM; Marta
Vieira (Ariá Sateré-Mawé) - Watyamã; Alice Karapana - Yupirunga; Zilda Mura - AIRM; Maria José Vieira (Sereia
Kokama) - OSPINA; Conceição Silva Kokama - Onça Pintada; Maria Rosenete Lopes
Marikaua - AIMEAM.
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