quarta-feira, 11 de maio de 2022

Simpósio dos Povos Indígenas gera propostas e ações recolhidas na Carta final


Foi dada a conhecer a carta do Simpósio Povos Indígenas, r-existência às políticas neoliberais na Amazônia, onde recolhe os debates acontecido em um encontro realizado nos dias 27, 28 e 29 de abril de 2022 em Manaus, que teve como objetivo “pensar, discutir e propor estratégias urgentes e necessárias para o bem viver dos povos e o desenvolvimento verdadeiro da Amazônia, não exploratório como vem acontecendo”

No encontro participaram representantes de diferentes organizações indígenas e movimentos sociais, contando também entre os organizadores com a Caritas Arquidiocesana de Manaus e o Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental - SARES.

A carta denuncia a “devastação da Amazônia por vários ângulos e em todas as direções”, afirmando que “os povos originários nesse país chamado Brasil, ainda não conseguiram ter de volta sua autonomia e seus direitos constitucionais assegurados pelos entes públicos federais”, pois uma coisa é o que está escrito e outra a prática.

A carta fala sobre as temáticas das mesas redondas realizadas e o que foi discutido nos grupos de trabalho, buscando “discutir diretrizes e ações em defesa do bem-viver, que geraram propostas sobre Participação e Consulta Prévia Livre e Informada, Formação e Mobilização, Planos de Vida e Sustentabilidade, Saúde, Territórios Indígenas, Educação, e Juventude Indígena.

O texto da carta recolhe as ações concretas para cada uma das propostas, dizendo que foi indicada uma comissão para acompanhar essas demandas e mobilizar as instituições indígenas e indigenistas para concretizar esses objetivos, colocando os nomes daqueles que fazem parte dessa comissão.




CARTA DO SIMPÓSIO POVOS INDÍGENAS, R-EXISTÊNCIA ÀS POLÍTICAS NEOLIBERAIS NA AMAZÔNIA

 Nas últimas décadas, estamos assistindo à devastação da Amazônia por vários ângulos e em todas as direções. São ambientais, culturais, sociais e político-jurídica. Tudo está sendo queimado, as leis que garantem nossos direitos à vida devastado em cada espécie da flora, da fauna, pessoas, práticas culturais e conhecimentos próprios que estão desaparecendo.

Passados mais de 500 anos do início do processo colonizador civilizatório, os povos originários nesse país chamado Brasil, ainda não conseguiram ter de volta sua autonomia e seus direitos constitucionais assegurados pelos entes públicos federais. A Constituição Federal de 1988, reconheceu os direitos territoriais, sociais e políticos conforme seus usos e costumes, suas línguas e autonomia. Mas não é o que se vê na prática.

Diante desse cenário, foi realizado nos dias 27, 28 e 29 de abril de 2022, em Manaus, o Simpósio Povos Indígenas, r-existência às políticas neoliberais na Amazônia, que teve como objetivo pensar, discutir e propor estratégias urgentes e necessárias para o bem viver dos povos e o desenvolvimento verdadeiro da Amazônia, não exploratório como vem acontecendo diante dos projetos de lei 191/2020 sobre mineração em terras indígenas e 490/2007 marco temporal e das políticas neoliberais que ferem os Direitos Indígenas.

O simpósio foi organizado pela Cáritas Arquidiocesana de Manaus, Serviço Amazônico de Ação, Reflexão e Educação Socioambiental - SARES, Grupo de Estudo e Pesquisas em Educação Escolar Indígena e Etnografia - Universidade do Estado do Amazonas - UEA, Laboratório Dabukuri - Universidade Federal do Amazonas - UFAM, Conselho Indigenista Missionário - CIMI, Fórum Estadual de Educação Escolar e Saúde Indígena do Amazonas - FOREEIA, Rede Eclesial Pan-Amazônica - REPAM. O evento contou com a participação de 99 pessoas e 56 instituições indígenas e não indígenas, a saber: AIKIRA, AIMEAM, AIMM, AIRM, AIUE, AKGV, AKIM, Aldeia Gavião, Aldeia Soares, Aldeia Tururukari-uka, Aldeia Cípia, Aldeia Miratu, AMARN, AMISM, APTRQAM, Art’s Regionais, ASPANA, ASPIARA, ASPTEAM, Maloca Bayaroa, CAPSOL, Ineamanatã, Jurupari, Karuara, Liderança Jovem, Lua Verde, MEIAM, MSE AÇÃO/RB, Mukuura Baré, Mura Parque das Laranjeiras, Nova Vida, Onça Pintada, OSBAV, OSPINA, Paroquia São Pedro, Pastoral do Migrante, São João Tupinambá, São Mateus, Uryry, Waikiru, Watchimauco, Watyamã, Yupirunga, Cáritas, CIMI, CIR, CMM, FOREEIA, MAKIRA ETA, PGE/AM, Rede Biribá, Sares, Seminário São José, UEA, UFAM, Secoya.

Durante o evento foram realizadas três mesas redondas, que tiveram as seguintes temática: i) Povos Indígenas e Defesa do Bem-Viver: Violação de Direitos Meio à Devastação Jurídica da Amazônia; ii) Povos Indígenas e Defesa do Bem-Viver em Meio as Multidevastações da Exploração Mineral nas Terras Indígenas na Amazônia; iii) Povos Indígenas e a Defesa do Bem Viver: Buscando Caminhos para o Direito à Cidade. Após cada mesa redonda foram realizados grupos de trabalho para discutir diretrizes e ações em defesa do bem-viver, que geraram as propostas sistematizadas abaixo:

 

Participação e Consulta Prévia Livre e Informada

·         Quando forem ser indicados indígenas para ocupar cargos no legislativo e executivo é necessário observar o perfil dos candidatos. Só podem ser indicadas pessoas que não se corrompam, tenham comportamento transparente, bom diálogo e comunicação com o movimento indígena e estejam comprometidas com causas coletivas.

·         Garantia de vagas para indígenas em todas as instituições do executivo e legislativo.

·         As comissões especiais que tratam de assuntos indígenas na Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas e nas Câmaras Municipais devem sempre contar com representação dos povos indígenas em todas as instituições.

·         Essencial que os povos indígenas sejam consultados de forma prévia, livre, informada, adequada e de boa fé frente a todos as medidas que afetem suas vidas ou territórios. Toda medida administrativa ou legislativa a gente tem direito de se apropriar, pedir mais informação e deve ser feita a consulta. Políticas que vem de cima para baixo, que vão contra a nossa vontade, temos direito de derrubar.

 

Formação e Mobilização

·             Mobilização e união e reivindicação contínua é sempre necessária, um meio de conquistar nossos direitos e objetivos.

·  -         Existem os programas de governo que deveriam implementar políticas públicas, e temos que formar nossas lideranças para fiscalizar os orçamentos e colocar lideranças em postos estratégicos.

·           Necessário promover a formação sobre às lideranças de forma contínua e imediata sobre os direitos indígenas e estratégias de reivindicação, especialmente sobre a constituição e convenção 169 da OIT.

·        - Elaboração de cartilhas sobre os direitos dos povos indígenas, que devem ser veiculadas para as comunidades indígenas e para todos os órgãos públicos que trabalhem oferecendo serviços sociais aos indígenas (educação, saúde, regularização fundiária, etc).

·         As demandas indígenas devem ser registradas através de documentos, que devem ser enviados para os três poderes.

·         Formação de uma rede de informações com fontes seguras, prontas para serem compartilhadas nas mídias sociais, auxiliando o compartilhamento de informações importantes e denúncia dos ataques aos nossos direitos e territórios.

·         Realizar intercâmbio com outros movimentos.

 

Planos de Vida e Sustentabilidade

·         É necessário criar trabalho e geração de renda de formas sustentáveis, como psicultura e agroecologia. Essas atividades podem gerar autonomia financeira para as necessidades das comunitárias, para não depender de instituições externas e para evitar a saída das comunidades.

·         É necessário que as instituições possam promover cursos nas comunidades voltados para elaboração de projetos sustentáveis e incentivar os empreendimentos locais.

·         O Estado precisa incentivar as compras institucionais dos produtos indígenas e que estas sejam pagas prontamente, sem atrasos, e com os valores contratados, pois os estados e municípios estão demorando muito para fazer os pagamentos e muitas vezes pagando menos do que o valor combinado.

·         Realizar formação de agentes indígenas ambientais

·         Necessário que o Estado atenda as demandas dos artesãos referente às necessidades de coleta de sementes e outros materiais para artesanato, principalmente em relação aos indígenas em contexto urbano, que não tem seus territórios reconhecidos e falta a garantia de acesso à bens naturais que permitam a reprodução cultural.

·         Outorga de Concessão do Direito Real de Uso e demarcação de Terras Indígena aos povos indígenas de Manaus em área próxima à cidade para extrativismo e manejo de recursos, essenciais para garantia da reprodução cultural dos povos indígenas de Manaus e Entorno.

·         Criação de cooperativa do movimento indígena, que consiga vender nossos produtos de uma forma que seja justa, um empreendimento coletivo.

·         Criação de espaço cultural físico permanente para trabalhar a cultura e a ancestralidade específica de cada povo. Se propõe um espaço cultural-jardim botânico, uma área que envolva uma área cultural com uma casa coletiva para prática da cultura, danças, exposições, feiras e com área para um jardim botânico que envolva trilhas e espaço de valorização das plantas utilizadas e nossos conhecimentos da natureza. É necessário que seja um espaço permanente, definido coletivamente pelo movimento indígena, que não seja modificado com as mudanças de governo. Para ter esse espaço também precisamos cultivar a união entre todos os povos e organizações indígenas em Manaus.

 

Saúde

·         Garantir a construção de UBSI direcionada aos comunitários indígenas em todas as zonas da cidade de Manaus

·         Garantir a contratação de agentes comunitários indígenas de saúde em todas as comunidades.

·         Reivindicar cursos de formação de agentes comunitários indígenas de saúde para as comunidades indígenas de Manaus.

 

Territórios Indígenas

·         Conscientizar os povos que as terras são suas, com ou sem demarcação. Parentes vamos continuar pisando firme com nossa língua e com a nossa cultura, porque a terra é nossa. A Funai não dá terra indígena, a Funai reconhece. O ato de demarcar é um ato declaratório, quem fala o que é terra indígena é o povo que ocupa aquela área. Pelo o fato de não ser área demarcada ninguém pode negar a prestar serviços e continua existindo o dever de proteção. O nosso vínculo com a nossa terra não é só de viver e ocupar. É um vínculo espiritual, são nossas ciências, nossos conhecimentos.

·         Fortalecimento do monitoramento territorial através do uso da tecnologia a nosso favor, estimulando o letramento digital, desenvolvendo cursos para manuseio de ferramentas tecnológicas, mapeamento e monitoramento por satélite, uso de drones e sistemas de comunicação.

·         Denunciar as invasões através de todos os meios e formas.

·         Sensibilizar as comunidades sobre as falsas promessas e riscos do garimpo e grandes empreendimentos.

·         Garantir os direitos territoriais indígenas em contexto urbano, a partir da regularização fundiária imediata das ocupações já existentes, respeitando a forma de regularização proposta pela comunidade.

·         Propostas habitacionais para os povos indígenas em contexto urbano que garanta moradias dignas e adequação urbanística e arquitetônica de acordo com as especificidades culturais.

·         Necessidade de oferta de serviços públicos adequados, considerando também infraestrutura de saneamento básico, lazer

·         Garantia de segurança pública, pois o tráfico de drogas é intenso em muitas ocupações e muitas lideranças indígenas são ameaçadas.

·         Os povos indígenas devem ter direito à tarifa social de energia e agua

 

Educação

·         Lutar pela criação da Universidade dos Povos Indígenas

·         Cobrar que o IFAM e a UFAM realizem vestibular indígena específico e diferenciado.

·         Aumentar a cota de estudantes indígenas nas universidades

·         Todas as línguas indígenas devem ser reconhecidas como co-oficiais.

·         Solicitar audiência pública para a Comissão de Educação da Câmara dos Vereadores para cobrar implementação da Educação Escolar Indígena conforme Lei Municipal 2.781/2021 de Manaus.

·         Garantir a contração de todas as categorias de professor indígena.

·         Garantir bolsa permanência para estudantes indígenas no ensino superior, pelo governo Federal e Estadual.

 

Juventude Indígena

·         É necessário que a juventude esteja no movimento, para isso precisamos de um movimento mais dinâmico, com mais interação e que garanta espaço de fala para os jovens em que eles possam expor suas vontades no movimento.

·         Desenvolver atividades estimulantes para a juventude indígena, para eles conhecerem desde cedo a luta.  Temos que orientar a juventude, ouvir a juventude e compartilhar responsabilidade com os jovens, assumindo cargos em nossas instituições.

·         Implementar programas de formação de comunicadores e articulação entre jovens influenciadores de base para que os jovens possam engajar com o movimento indígena a partir de suas áreas de interesse.

·         Criar Rede de Jovens Comunicadores

·         Incentivar a Juventude no desenvolvimento de habilidades com as tecnologias digitais para defesa dos territórios indígenas.

Foi indicada uma comissão para acompanhar essas demandas e mobilizar as instituições indígenas e indigenistas para concretizar esses objetivos, composta por:

Natalino Kokama - ASPIARA; Francisco Cruz (Chiquinho Kambeba) - Tururukari-uka; Afonso Dutra - ASPITEAM; Marta Vieira (Ariá Sateré-Mawé) - Watyamã; Alice Karapana - Yupirunga; Zilda Mura - AIRM; Maria José Vieira (Sereia Kokama) - OSPINA; Conceição Silva Kokama - Onça Pintada; Maria Rosenete Lopes Marikaua - AIMEAM.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

Nenhum comentário:

Postar um comentário