domingo, 9 de julho de 2023

Dom Leonardo: “O olhar dos simples, dos pequeninos, é em geral mais límpido. Eles vão diretamente ao essencial”


Qual o segredo dos pequeninos que desperta louvor, oração, ação de graças? Os pequeninos, as crianças, os de pouco estudo? Quem são os pequenos que abrem as portas da admiração, da louvação? Quem são os sábios e entendidos a quem Deus esconde ou se esconde; para quem Ele permanece velado?”, se perguntou o cardeal Leonardo Steiner no início de sua homilia do 14º Domingo do Tempo Comum, após citar o texto do Evangelho do dia.

Segundo o arcebispo de Manaus, “Deus esconde as coisas, as belezas, as preciosidades, as sutilezas, os encantos do Reino dos Céus aos ‘sábios e entendidos’, mas as revela aos pequeninos. Deus nega-se aos doutos ensoberbecidos pela aparência do próprio de saber, e se revela aos simples, os que não sabem que sabem, os pequeninos”.

“Sábios e entendidos, aqueles que já sabem, sabem demais. Os que pensam tudo saber, já não necessitam saber, pois fundados no próprio entendimento. Os sábios e entendidos, fechados em si mesmos. Ao saber do já sabido, nada mais pode ser revelado; nada mais para o qual possa ser despertado. Mas é do encantamento, da admiração, da surpresa, da revelação que nasce a gratidão, a abertura de novos horizontes, novas compreensões, sonhos, verdades”, refletiu Dom Leonardo.

“Os sábios e entendidos, os autossuficientes, os fechados; os que compreendem, mas pouco sabem. Os entendidos que acumulam saber, sem sabedoria; que pensam ter-se apropriado da sabedoria, mas permanecem na ignorância. Aqueles que por ‘saberem demais’, pouco espaço sobra para o outro com suas fraquezas e necessidades. O mistério da fraqueza, da finitude, não os atrai, não os toca. Existe uma espécie e autossuficiência, auto asseguramento. Justificam a finitude, o limite, fecham-se ao Mistério da salvação”, insistiu o cardeal.




Em palavras do arcebispo de Manaus, “as pessoas que pensam entender do céu e da terra, tudo verificam pouco entendem; tudo comprovam, pouco percebem; tudo interrogam com respostas já sabidas. Esse tipo de saber baseado no cálculo, na soma, esquecido da receptividade de deixa-se tomar pelas manifestações admiráveis dos céus, da presença dos pássaros do céu, das ervas dos prados, dos lírios do campo. Tantos seres que manifestam a graciosidade da presença de Deus. Esses que se sentem espertos, inteligentes, na acumulação e devastação, apenas para a cumulação. Pouca admiração e reverência para com o Mistério que tudo deixa surgir, emergir, que tudo guarda e recria”.


Os grandes e poderosos, os sábios e inteligentes do Evangelho de hoje, não percebem a presença do Reino de Deus e não acolhem o seu horizonte, o seu sentido. O Reino se esconde, resiste aos soberbos, por mais santos que imaginam ser”, disse o arcebispo, citando as palavras de Santo Hilário, onde diz: “estão ocultos aos sábios os segredos e as virtudes da Palavra de Deus e para os pequeninos estão abertos: aos que são pequenos em malícia, mas não em inteligência; aos que são sábios aos olhos da presunção, mas não aos da prudência”.


“E porque pensam tudo compreender e saber, tudo dominar e assegurar, dificilmente experimentam o que nos disse Jesus”, afirmou Dom Leonardo citando o texto do Evangelho: “vós que estais cansados e fatigados sob o peso dos vossos fardos, e eu darei descanso. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração, e vós encontrareis descanso. Pois o meu jugo é suave e meu peso é leve”.


Segundo o cardeal, “o saber que pensa saber é um fardo, perde a suavidade das revelações e manifestações do Espírito: a Bondade, a Misericórdia, a gratuidade. Desaparece aquela abertura e disponibilidade própria da receptividade, do acolhimento. Os sábios e entendidos correm o risco de estarem assentados sobre os seus saberes e passam a vida sem perceber que Deus deseja oferecer o seu amor paterno-materno. O caminho da fé tem outra tonância: tem suavidade, leveza, mesmo na dor e no sofrimento. É a vida dos pequeninos”.




Com as palavras de Santo Agostinho: “Sábios e prudentes, se entende os soberbos, segundo manifesta o Senhor com as palavras: 'Revelaste estas coisas aos pequeninos'. E quem são os pequeninos, senão os humildes?”, Dom Leonardo disse quem são “os pequenos, os humildes como nos ensinava a primeira leitura: ‘Eis que vem teu rei ao teu encontro; ele é justo, ele salva; é humilde e vem montado num jumentinho!’”. Ele insistiu que “o verdadeiro encontro acontece na humildade, no ainda não saber. Os pequeninos, os simples, os humildes, os disponíveis, os abertos, os procurantes, os caminhantes, os que não sabem, mas desejam saber, os do não-saber, abertos às revelações que Deus oferece”.


“Os pequenos, os despojados, os abertos ao porvir, os que não vivem de estruturas pré-fabricadas, os que são abertos, livres diante da vida, do futuro. Os reverentes diante dos sofrimentos, da dor; os escutantes da Fonte da gratuidade da Água viva. Os pequenos, os que não entram em desespero, mas se recolhem para descobrir o mistério presente no desconforto do viver, no mistério do embate da vida. Os pequenos são como criança. Criança-criança, na sua originalidade, na sua espontaneidade, no seu límpido dar-se, no ser apenas criança, sem as amarras e sonhos de adultos. Nesse sentido, no pequenino se manifesta a humildade. Humildade como o húmus, como o lugar do nascer, do vir à luz, da possibilidade de plenifica a vida”, refletiu o arcebispo de Manaus.


Segundo ele, “o olhar dos simples, dos pequeninos, é em geral mais límpido. Eles vão diretamente ao essencial. Não há muitos interesses tortuosos, mesquinhos. Sabem do sofrer, do sentir-se mal e do viver sem segurança. Não teorizam, não complicam, conseguem viver na insegurança, e na necessidade. Vivem conduzidos pela esperança! São os primeiros a entender o Evangelho. Pessoas de coração simples, pessoas próximas de Deus. Mulheres e homens sem grande possibilidade de estudo, outras com alto grau de acadêmico, que transpiram simplicidade, humildade, limpidez, transparência, disponibilidade”, destacando que “os pequenos, os humildes, os do não-saber, despertam, buscam a sabedoria, as belezas e nobrezas do Reino de Deus: a liberdade e liberalidade, o amor e a gratuidade, a esperança e a vinda do Reino de Deus!”.





Os pequeninos do Evangelho descobrem com certa facilidade o ensinamento de Jesus”, afirmou Dom Leonardo citando o texto do Evangelho. Ele disse que “Papa Francisco nos ensina que o alívio, o descanso que Jesus oferece aos cansados e oprimidos não é apenas alívio psicológico ou esmola, mas a alegria dos pobres que são evangelizados e ao serem evangelizados são construtores da nova humanidade. Eis o alívio, o descanso, é a sua presença benévola e transformativa. É uma mensagem para todos nós, para todos os homens e mulheres de boa vontade, que Jesus ainda hoje dirige a um mundo que exalta aqueles que são sábios e entendidos. O mundo exalta os ricos e poderosos, independentemente dos seus meios, e por vezes espezinha a pessoa humana e a sua dignidade. E vemos todos os dias os pobres espezinhados. É uma mensagem para todas as nossas comunidades, para toda a sociedade: viver a irmandade. As nossas comunidades ofertando as obras de misericórdia, a evangelizar os pobres, a serem mansas, humildes e generosas. Jesus deseja que sejamos pequeninos que nos sintamos amados e cuidados pelo Pai do céu”.


Com as palavras do místico H. Harada, o cardeal disse que “não estaria o Evangelho, dizer um místico, insinuando que no fundo da alma da nossa mais íntima humanidade nasce sempre de novo o pequenino, a criança, transparência, a inocência batismal, sem o qual não poderemos jamais entrar no Reino dos Céus! Pois diz o Senhor: “Em verdade lhes digo: se não virarem crianças, se não se tornarem como crianças, jamais entrarão no Reino dos Céus. E todo aquele que se humilhar como esta criança, este é o maior no Reino dos Céus”.


O arcebispo fez um chamado: “acheguemo-nos, irmãs e irmãos, a Deus como pequeninos, filha-criança, filho-criança, necessitados, humildes, desdobrados, sem dobras, transparentes, soltos, livres. Necessitados de amor e esperança, sabendo-nos por Deus desejados, amados. Aproximemo-nos com humildade e mansidão dos pequeninos, e perceberemos, como crianças, a suavidade da presença do amor materno-paterno. Tudo o que nos parecia pesado, cansaço, fardo, tornar-se caminho de libertação. Como pequeninos que nada sabem, vamos apreendendo com as manifestações de Deus. Como nos ensinava Paulo: teremos o espírito a morar em nós e no Espírito da pequenez, da transparência viveremos”.


Finalmente, ele pediu que “Nossa Senhora, a pequenina, a humilde e nobre, implore de Deus a sabedoria dos pequeninos para seguirmos a Jesus caminho, verdade e vida, escondidos aos sábios e entendidos, mas revelado aos humildes, aos pequeninos”.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

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