domingo, 11 de agosto de 2024

Cardeal Steiner: “No ‘atrai’ somos despertados para a gratuidade do seguir Jesus, fugindo de moralismos, de ideologizações da fé”


No 19º do Tempo Comum, o arcebispo de Manaus e presidente do Regional Norte1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB Norte1), cardeal Leonardo Steiner, iniciou sua homilia definindo a Palavra ouvida como “consoladora e animadora”, afirmando que “somos atraídos pelo Pai do céu. A Encarnação da fé é uma história de atração. Deus atraindo, porque amando.”

Segundo o cardeal Steiner, “se chegamos a conhecer a Jesus e o seguimos, é porque o Pai nos atrai. Ele é um movimento atrativo. Como se Jesus nos dissesse: quem quer que seja, se vier a mim, em qualquer tempo, em todos os tempos, em todas as gerações, se chegar até mim, se tonar meu seguidor, minha seguidora... foi pego pelo movimento atrativo do Pai, o charme do Pai. Não sou eu que atraio, é o Pai que atrai.”

O arcebispo de Manaus destacou que quem atrai é o amor; fomos atingidos por uma atração amorosa! Um amor procurante que seduz, encanta. O texto sagrado insinua que não se trata de uma atração acontecida no passado, mas que o ‘atrai’ do Pai, nos conduz até o encontro amoroso no Reino definitivo. Um convite a estarmos sempre mais em sintonia, em comunhão, submergidos no Amor atrativo. É uma atração que se estabelece no tempo, mas atravessa todos os tempos.”

Ele lembrou as palavras de Santo Agostinho, que nos faz ver que somos atraídos com agrado e prazer: “Eu sou o pão que desceu do céu”. O pão que alimenta, que tem sabor. Há um apetite no coração pelo qual ele tem o sabor do pão do céu. Não é com a necessidade, mas com o prazer; não é com a violência, mas com o deleite que somos atraídos: o pão do céu. Por isso, ensina não só os sentidos têm os seus deleites, mas também a alma. É um deleite para a alma o “atrai” do Pai!



O arcebispo de Manaus sublinhou que “a alma amante tem fome da vida do ‘atrai’... Daí, o versículo terminar com a ressurreição dos mortos... a vida eterna, o ‘viverá eternamente’. Sim, atraída para dentro da eternidade, do amor da Trindade”. Ele perguntou: “O que suscita o ‘atrai’!?”, afirmando que “certamente ultrapassa a inquietação e a frustação da murmuração: ‘Não murmureis entre vós’. Na murmuração se encontra um certo azedume, um amargor, às vezes uma indiferença. Mas quem se sente atraído no amor é tomado pela leveza, pelo contentamento, pela fecundidade da vida. Fecundidade da vida que desperta a leveza quase infantil de viver. Uma pedagogia que abre constantemente possibilidades existenciais frente à cotidianidade dura e às vezes aniquiladora.”

“O encanto da atração traz no seu bojo o sentido de fecundidade, um cuidado materno-paterno em relação aos necessitados, aos desvalidos, aos que a sociedade rejeita, aqueles e aquelas que andam e navegam sem destino, sem porto, sem estrada, sem rio, sem chegada! O atrai abre olhos para o que está por vir: porto, espaço e tempo de encontro. O ‘atrai’, então, desperta leveza, sutileza, humor, transparência, pois ‘Tu és o gáudio. Tu és a nossa esperança e alegria’”, disse, inspirado em Francisco de Assis.

Segundo dom Leonardo, “no ‘atrai’ somos despertados para a gratuidade do seguir Jesus, fugindo de moralismos, de ideologizações da fé, de acharmos que podemos aprisionar em conceitos e dogmatismos as delicadezas da atratividade de Deus. É que no ‘atrai’ há liberdade, a graça de corresponder gratuitamente à atração”. Diante disso, ele afirmou que “talvez, por isso, Santo Agostinho nos adverte contra a soberba, no sentido de considerar que chegamos a Jesus Cristo com as nossas próprias forças, nossa vontade, por própria decisão. Ele nos ensina que este orgulho, este inchaço da alma, não procede, pois mesmo essa presunção advém da graça de sermos ‘atraídos’.”

A ‘Igreja não cresce por proselitismo, cresce por atração’. A atração testemunhal. Esse testemunho que nasce da alegria assumida, aceita e depois transformada em anúncio, é uma alegria fundada. Sem este gozo, sem esta alegria não se pode fundar uma Igreja, não se pode fundar uma comunidade cristã. É uma alegria apostólica, que se irradia, que se expande”, disse o cardeal citando Papa Francisco.



Comentando a primeira leitura, ele destacou que “ouvíamos como profeta Elias foi atraído e enviado. O profeta de Deus, o invocador do fogo do céu que consumiu não só o sacrifício, mas também o altar, o vencedor dos sacerdotes e profetas de Baal, se colocou em fuga. Perseguido, foge esmorecido, desalentado, inconformado, tomado pela desilusão. Caminha deserto adentro e, depois de um dia a caminho esquecido da atração, pede a morte: ‘Agora basta, Senhor! Tira minha vida, pois não sou melhor que meus pais’ (1Rs 19,4).”

“A pregação de Elias dera em nada. Em vão tinha labutado e lutado. Até então, tinha dado testemunho de um espírito que era pura vontade e poder, esquecido que fora atraído! Doara-se inteiramente num ímpeto vigoroso e numa consciência de absoluta responsabilização e zelo. Nesse ímpeto e nessa absoluta doação, que desencadeava ação, atuação, execução, trabalho e realização, Elias, talvez, se julga próximo de Deus. Na realidade ele entra em desalento por estar servindo com as próprias forças, não com as forças e graças da atração”, comentou sobre o texto da primeira leitura.

O cardeal ressaltou que “luta com suas forças, o profeta supera os deuses e seus profetas, mas entra numa espécie de depressão. E Deus sai em seu auxílio e o atrai. No meio do deserto, na dormência da morte, na desilusão, na perda da vontade de poder, é acordado, atraído: ‘Levanta-te e come!’ (1Rs 19,5). Ele olhou e vê à sua cabeceira um pão cozido sobre pedras quentes e uma bilha d’água. Se levanta, come e bebe e “com a força deste alimento, andou quarenta dias e quarenta noites, até chegar ao monte de Deus Horeb” (1Rs 19,8).”

Nessa perspectiva, o arcebispo de Manaus disse que “ele recebe o pão e a água, retoma o caminho depois da decepção, do cansaço, da fuga, da desilusão, da não conversão, da perseguição. O pão e a água erguem o profeta do medo e da fuga, o colocam de pé e perfaz o caminho da sua origem e de seu povo, o monte Horeb. Horeb o monte da aliança, do encontro, da promessa. É atraído para o monte onde Deus de Abraão, Isaac e Jacó começou a revelar-se como Jahvé; foi nesse monte que Moisés viu o Senhor face a face e entrou na sua intimidade; foi nesse monte que se concluiu a aliança, fundamento do Povo de Deus, concedendo-lhe os mandamentos para permanecer fiel à atração. Com o pão caminha para o lugar da fonte, do encontro, das revelações de Deus.”



Finalmente, ele destacou na primeira leitura que “o caminho de Elias através do deserto tornou-se, assim, um paradigma de toda a existência humana, pois iluminação da atratividade de Deus. Nossa vida é como a viagem do profeta. Cheia de medos, fugas, fidelidades e infidelidades, fomes e sedes, frustrações, desilusões, sonhos, pregações, buscas, propósitos, desejo de morte, mas tem como fio condutor a atratividade de Deus. A visita de Deus, a atração, que nos conforta com o pão da fé e da confiança que vêm do alto e que nos levam a retomar, sempre de novo, o sentido de nossa vida até Horeb, o monte de nossa origem, Deus. Aquela beleza da atratividade de Deus no meio do deserto, para manifestar na suavidade da brisa”, inspirado no comentário de Fernandes e Fassini.

Na segunda leitura, o cardeal Steiner ressaltou que “São Paulo nos ensinava que o Pão descido dos céus transforma nossa humanidade, pois Des nos marcou com o selo da libertação. Atraídos e participantes do Pão descido do céu, somos convidados a superar a amargura, a irritação, a cólera, gritaria, injúrias. A atração do Pão nos transforma em bondade uns para com os outros, nos leva a ter compaixão, misericórdia, perdão, consolo. Sim, como o Pão descido do Céus que nos atrai, somos transformados em imitadores de Jesus, repartindo a nossa vida, os nossos dons, também os nossos bens, pois fomos em Jesus atraídos pelo Pai. São Paulo termina a afirmando: Como Cristo nos amou e se entregou a si mesmo a Deus por nós, em oblação e sacrifício de suave odor, vivei no amor. A Eucaristia é atrativa, pois nos convida ao amor: límpido e gratuito.”

Falando sobre o mês vocacional, ele lembrou que “rezamos pelos irmãos e irmãs que receberam a graça da atração de Deus para viver o amor no matrimônio. A atração mútua suscitada pela atratividade de Deus, possibilita fecundidade e geratividade. Fecundidade na transformação e salvação mútua, e geratividade pela presença dos filhos. É a vocação que visibiliza o que ouvíamos na segunda leitura: Como Cristo nos amou e se entregou a si mesmo a Deus por nós, em oblação e sacrifício de suave odor, vivei no amor. Essa entrega livre e gratuita no amor que fortifica, revigora e liberta a vocação matrimonial.”

Igualmente, dom Leonardo pediu lembrar que “hoje o Dia dos Pais”, pedindo “gratidão e oração pelos nossos pais! Rezemos pelos nossos já falecidos. Rezemos pelos pais que não reconhecem e exercem a graça da paternidade. Peçamos a graça da realização na paternidade aos nossos vivos. Possam inspirar-se na paternidade divina.”

“Irmãs e irmãos, Deus nos atrai e nos concede a graça da vocação. O profeta deixou-se atrair no deserto pelo pão e recebeu vida nova. Deixemo-nos atrair pela vocação recebida. Deixemo-nos atraídos pelo Pão que é vida do mundo”, concluiu o arcebispo de Manaus.



Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

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