quinta-feira, 28 de outubro de 2021

Relatório de Violência contra os povos indígenas: “Coragem para continuar a missão de denunciar”


Unidos em comunhão corajosa e profética em defesa dos povos indígenas. Assim se sente a Igreja do Brasil segundo o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Em suas palavras no lançamento do “Relatório Violência contra os povos indígenas no Brasil” (pode abaixar aqui), acontecido neste 28 de outubro, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, insistia em que a perseguição aos povos acontece porque “não são fruto da produção de dinheiro, de lucro, mas da defesa da terra, do meio ambiente e de uma cultura que tem sempre muito a nos ensinar”.

O arcebispo de Belo Horizonte chamou a criar uma sensibilidade “para que não se perpetrem tantos crimes contra os povos indígenas”. Ele mostrou o apoio explícito da CNBB ao Cimi (Conselho Indigenista Missionário) e todos os que estão a favor das causas indígenas, afirmando que “nós juntamos corajosamente, profeticamente, nossa voz para denunciar tudo aquilo que é crime contra os povos indígenas”. Segundo o presidente da CNBB, o respeito aos povos indígenas é um capítulo fundamental na reconstrução da sociedade brasileira, algo fundamental, pois “o Brasil, lamentavelmente é uma sociedade da impunidade”.

“A CNNB permanece ao lado dos indígenas como parte do compromisso pela vida, especial essa vida mais vulnerabilizada”, segundo Dom Joel Portella Amado. Ele destacava o papel do Cimi ao longo de cinco décadas, “de resistência, de denúncia, de persistência, de coragem e solidariedade”. Segundo o bispo auxiliar do Rio de Janeiro não há como não sentir perplexidade diante dos rumos do país, afirmando que “um país é medido, entre outros aspectos, pelo modo como trata sua gente”. Ele reclamou proteção à vida, respeito e verdade nas informações como caminho para consolidar a democracia no Brasil.

O Papa Francisco em Puerto Maldonado, algo que Dom Roque Paloschi considera uma visita histórica, e onde ele mesmo estava presente, disse: “Nunca os povos originários estiveram tão ameaçados como estão agora”. O presidente do Cimi destacou que “é com essa voz de denúncia e de indignação que trazemos mais uma vez os dados de violência e de violação de direitos contra os povos indígenas”.




O “Relatório Violência contra os povos indígenas no Brasil”, desde 1996, é um importante instrumento de denúncia da violência e das violações que acometem os povos originários até hoje no país. Os dados do ano 2020, “refletem a realidade dos povos indígenas no segundo ano do Governo Bolsonaro”, segundo o arcebispo de Porto Velho. Ele insistiu em que “enquanto no mundo havia um momento de atenção e cuidado, no Brasil, lideranças do executivo propagavam discursos de ódio, negacionismo, violando a Constituição Federal e abrindo os territórios indígenas para a grilagem, a soja, o garimpo, o desmatamento, e inúmeras outras violências contra os líderes indígenas que se opõem à mercantilização da vida e da terra”.

O bispo relatou como “comunidades foram expulsas das suas terras, lideranças foram assassinadas, e com as políticas anti indígenas incentivou-se o divisionismo no interior dos povos indígenas”. Dom Roque Paloschi vê isso como “uma vergonha para o país, que trata os primeiros habitantes com tanta violência, descaso e preconceito”. Movido pela esperança pede que “os povos originários, povos de antigos perfumes, continuem a perfumar o continente contra todo desespero”.

O presidente do Cimi destacou a teimosia dos povos indígenas na defesa de seus direitos, lembrando as mobilizações Levante pela Vida e das Mulheres Indígenas, guardiãs e cuidadoras da vida e da terra, como algo que “nos enche de coragem para continuar a missão de denunciar mais uma vez as violências e violações contra os povos originários”. Daí, Dom Roque convida à solidariedade, “a escutar o grito dos pobres e o grito da terra, que já não aguentam mais tanta exploração e tantas mortes”.



Finalmente se pergunta: “o que ficará para as gerações futuras se continuarmos com tanta exploração e morte?”. Diante disso insiste em que “a Igreja continua sendo aliada dos povos originários, das suas lutas por mais vida, terra e direito, e reafirma seu compromisso na denúncia de todas as situações de morte que atentam contra os povos originários, que atentam contra a dignidade das pessoas, atentam contra a causa indígena, porque a causa indígena é de todos nós”.

O Brasil está diante de “um retrato trágico para os povos originários no país”, segundo secretário executivo do Cimi, consequência da grave crise sanitária provocada pela pandemia. Antônio Eduardo Cerqueira, falando sobre a apresentação, que “não é um prazer, mas sim uma necessidade”, chamou a refletir sobre a postura do atual governo com relação aos povos indígenas, relatando diferentes exemplos sobre essa situação.

O Relatório, com mais de 240 páginas, recolhendo os dados enviados pelos regionais e os missionários, foi apresentado por Lucia Rangel, afirmando que “mostra uma sociedade com ganas de eliminar os povos indígenas”, que são considerados como não cidadãos. O relatório traz um retrato significativo das diversas formas de violências praticadas contra os povos indígenas em todo o país.



Um exemplo disso foi relatado por Ernestina Afonso de Souza, liderança do povo Macuxi, da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Ela mostrou sua tristeza diante da situação que estão passando os povos indígenas do Brasil, o aumento da violência e dos crimes contra os povos indígenas e a Mãe Terra. Ela denunciava a falta de assistência do governo federal aos povos indígenas.

Esses problemas sérios estão presentes na Terra Indígena Yanomami, também em Roraima, segundo denunciava Dário Vitório Kopenawa Yanomami. O vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami denunciou a presença de mais de 20 mil garimpeiros ilegais e as graves consequências que provocam. Junto com isso as ameaças de morte que sofrem, o aumento do alcoolismo, das drogas e as ameaças aos povos isolados. Também o aumento de doenças em consequência do mercúrio que polui a água.

O Relatório quer, segundo Roberto Liebgott, “chamar a atenção dos poderes públicos para que as invasões, para que esse processo genocida seja paralisado e os povos indígenas tenham efetivamente seus direitos garantidos”. Segundo ele, “o governo brasileiro adotou uma espécie de tática de guerra contra os povos indígenas, contra os seus territórios e contra seus direitos individuais e coletivos”. Por isso, denunciou “o patrimônio público sendo entregue para a saga devastadora de setores que tem como fundamento a economia criminosa”.

O documento constata as ameaças contra os povos indígenas, segundo Luis Ventura, agente do Cimi Amazonas e Roraima. Ele afirma que aumentaram “com a cumplicidade e a anuência de um Governo Federal que incentivou atividades ilegais dentro das terras indígenas e que se omitiu de ações de proteção e de fiscalização das terras indígenas, que são suas obrigações constitucionais”. Por isso, ele insiste que estamos diante de “um instrumento de denúncia, e ao mesmo tempo um chamado a toda a sociedade, a todas as instituições públicas para relembrar os esforços na defesa dos direitos fundamentais, na defesa dos direitos coletivos dos povos indígenas”.


Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte 1

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