domingo, 23 de outubro de 2022

Dom Leonardo: “Nesse tempo de eleições percebemos quanto falta de humildade, de respeito, de mansidão, de escuta”


Dois homens sobem ao Templo para rezar: “um o bom, o correto, o certo; o outro o pecador, o cobrador, o coletador de impostos. Duas vidas, dois modos de vida, dois modos de prece. Dois modos de apresentar-se diante de Deus”, afirma Dom Leonardo Steiner comentando as leituras do 30º Domingo do Tempo Comum.

O Arcebispo de Manaus afirma que “um o homem da lei-norma, aquele o certo, que vive corretamente; aquele que faz o que a Lei pede e prevê. O fariseu, o bom, o cumpridor da Lei de Moisés. Aquele que está quase acima do bem e do mal”. O cardeal lembra as palavras desse homem bom: “Eu não sou como os outros homens, ladrões, desonestos, adúlteros, nem como este cobrador de impostos. Eu jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de toda a minha renda”.

Segundo Dom Leonardo Steiner, “a reza é autossuficiente, o elogio de si mesmo para si mesmo. Não apenas sobe para o templo, ele sobe e se põe acima dos outros homens: dos ladrões, dos desonestos, dos adúlteros. Ele sobe e olha de cima para baixo e vê e julga os outros: são ladrões, desonestos, adúlteros. Ele sobe tanto e se põe acima e despreza o outro; o outro não passa de cobrador de impostos, desprezível”.

Alguém que sobe nas próprias virtudes: “Eu jejuo duas vezes por semana e dou o dízimo de toda a minha renda”. Em palavras do Cardeal da Amazônia, “Ele é um homem íntegro, fiel, cumpridor da Lei, um exemplo a ser seguido. Ele basta a si mesmo, ele se tem a si mesmo. Ele chega subir no próprio conceito de si mesmo. Ele está acima do bem e do mal. Ele é o templo, a casa para onde ele sobe para render graças por tudo aquilo que ele é e faz. A sua prece é um autoelogio, uma auto incensação. Mas, a sua prece não sobe, rasteja pela terra, como fumaça em dia de chuva. A sua prece perdeu a suavidade: é sem brisa, sem leveza, sem asas. Ela não sobe, não toca a Misericórdia!”.



“Os pecadores e necessitados de misericórdia são como o outro que era um cobrador de impostos”, destaca Dom Leonardo. Ele volta o olhar para “aquele que está a serviço do estrangeiro. O cobrador de impostos, aquele que se preocupa pouco com a Lei. Ele não é o justo nem o ajustado. Ele não tem nada para apresentar a seu Senhor e Deus a não ser a sua fraqueza e miséria”.

“Quase tímido e temeroso permanece à entrada do templo. Não se atreve a erguer os olhos, apenas bate no peito e murmura: ‘Meu Deus, tem piedade de mim que sou pecador’”, afirma o Arcebispo de Manaus em relação com alguém de quem diz: “Pobre o homem que nem sequer eleva seu olhar; pobre o homem que não entra na casa de seu Senhor e Deus”.

“No entanto, contemplando o cobrador de impostos ali parado, olhos por terra, batendo no seu peito, balbuciando, não percebemos nele timidez, nem altivez; nem mesmo vergonha, muito menos medo”, segundo o purpurado. Falando do publicano, ele o vê como aquele que “a sua condição é sem soberba, sem orgulho. Ele ali parado, sem movimento, num recolhimento, parece necessitado; é isso: tão contrito. Ele parece ali tão inteiro, tão verdadeiro, tão... sim, tão livre à entrada do templo. Ele é como os outros homens: ‘ladrões, desonestos, adúlteros, ele é o cobrador de impostos’. Ele não jejua ‘duas vezes por semana e não dá o dízimo de toda a minha renda’. Ele é o outro, não é aquele que a Escritura ensina que deveria ser. Ele é apenas ‘o cobrador de impostos’”.

No cobrador de impostos “nada é aparência, tudo é transparência, pura transcendência”. Segundo Dom Leonardo, “esse homem ali tão reverente, tão penitente, é apenas pedinte. E, assim, pedinte e penitente, no recôndito de sua alma eleva a súplica: ‘Meu Deus, tem piedade de mim que sou pecador!’ Uma contrição sem aflição, humilde, sem ser humilhado”.

 


O Arcebispo de Manaus insiste em que “não veio justificar, não veio barganhar, apenas suplicar. Não veio comparar, não veio demonstrar, apenas se apiedar. Sem aparência, na pura transparência contrita, reverente, livre prostrada, cuidada, recolhida na terra deserta de sua fraqueza, implora compaixão”. Daí que o cardeal ressalta que “quando se busca a misericórdia no amor, o suplicante na prece não se aproxima, permanece contrito na distância, à soleira. O necessitado de misericórdia, o tocado pela misericórdia, o atraído pela misericórdia ao suplicar recolhe os olhos, bate no peito, deixa entrever a nudez e a fragilidade”.

Nessas pessoas estamos diante de alguém em quem “tudo é transparência de uma existência que se vê e se assume como traidora, como pecadora, como devedora. Devedora, pecadora, traidora quando tomado pela desmedida da misericórdia de Deus”, segundo o Arcebispo de Manaus. Um Deus que é a Misericórdia, “jamais despreza a súplica do órfão, nem da viúva, quando desabafa suas mágoas”. Dom Leonardo afirma que “da desmedida amorosa e misericordiosa do Senhor que vela e cuida do órfão e da viúva, a desmedida que habita e é o templo, deixam vir à luz o recato e o pudor. O recato e o pudor, que despertam a reverência da distância e o recolher os olhos que não atrevem a tocar o céu. O recato e pudor de uma vida percebida na quase inutilidade a bater no peito e clamar: ‘Meu Deus, tem piedade de mim que sou pecador!’”.

Recordando as palavras do Livro do Eclesiástico que fazem parte da primeira leitura do dia: “Ele não é parcial em prejuízo do pobre, mas escuta, sim, as súplicas dos oprimidos; jamais despreza a súplica do órfão, nem da viúva, quando desabafa suas mágoas. A prece do humilde atravessa as nuvens”, Dom Leonardo insiste em que “o publicano não é o cumpridor da Lei, é o pecador! Como pecador que se humilha, se apresenta diante de Deus. Sim, a prece humilde atravessa a nuvens chega ao coração Deus”. Por isso, ele descobre como algo extraordinário o fato de “perceber que o publicano na sua condição apenas pede compaixão, busca o coração de Deus!”.

O cobrador de impostos, “subiu carregado de suas infidelidades, atraído pela misericórdia de Deus que permanece eternamente”. Olhando para a cena que aparece no texto, o purpurado destaca que “ele ali na soleira da porta, na sua contrição, deixa o templo ainda mais vazio, com sua prece e reverência; o templo com a amplidão do céu! O publicano ao apresentar-se diante do Senhor na sua finitude e miséria, no reconhecimento de sua vida pecadora, esvazia o templo de si mesmo e Deus a tomar os espaços de sua pessoa com a sua misericórdia”. Segundo Dom Leonardo, “a suavidade da presença de Deus não é perturbada pelo publicano, pelo contrário, a sua contrição e imploração deixam a suavidade da misericórdia divina movimentar-se livremente entre as colunas, os espaços amplos de um coração arrependido”.

 


“A prece, a súplica nascida da nua fraqueza humana e do recato e do pudor que a desmedida da presença inefável suscita, sobe até as entranhas da misericórdia de Deus”, insiste o Arcebispo de Manaus. Ele não duvida em dizer que “somente essa súplica e prece sobem e tocam os céus”. Uma ideia que aparece no Livro do Eclesiastes, insistindo na prece humilde que “atravessa as nuvens”. Dom Leonardo ressalta que “somente essa prece e súplica, conforme o Senhor no Evangelho, justificam. Essa torna justo, ajustado, conformado, aquele ladrão, desonesto, adúltero. Ele volta resgatado no seu pudor e recato que a desmedida da misericórdia suscita”.

Em relação com a conjuntura atual no Brasil, o cardeal insiste em que nesse tempo de eleições percebemos quanto falta de humildade, de respeito, de mansidão, de escuta. Quanta prepotência, notícias falsas, busca do poder pela mentira”. Uma afirmação importante diante do fato de que “o publicano que volta justificado não se enaltece, não se gloria, não acusa, não agride o outro para provar que justo; não se justifica, não justifica o erro, não se apoia na fraqueza do outro. Apenas reconhece a sua fraqueza, reconhece a sua condição. Diante de Deus é límpido, transparente. Deus não suporta a falsidade”.

O Arcebispo de Manaus diz se alegrar “ao ver a proximidade de Deus na fraqueza do cobrador de impostos”. Diante disso, ele insiste em que “também nós permanecemos por pudor e recato à distância, batemos em nosso peito e balbuciamos: ‘meu Deus tem piedade de mim’, desejosos de misericórdia”. Dom Leonardo destaca que “Deus se alegra, se enche de misericórdia, se apieda”. Um Deus que “sua misericórdia vai de geração em geração”, que é o “Pai das misericórdias e o Deus de toda a consolação”, que “é cheio de terna misericórdia”, que “é só misericórdia!”. Diante disso, “como o publicano na humildade de nossa pobreza-pecado também voltamos para casa justificados como o publicano. Quando limpidamente, de modo transparente nos aproximamos de Deus sempre voltamos justificados, perdoados, libertados”.

Dom Leonardo insiste em que “o movimento de conversão, conduzido pela misericórdia desperta para a percepção da nossa miséria e fraqueza”. Segundo ele, “a nossa miséria e fraqueza publicana também murmura: ‘Meu Deus, tem piedade de mim que sou pecador!’”. Daí que ele insista em que “sempre e somente na soleira visitamos a casa da misericórdia e voltamos tocados pelo Deus do amor e da reconciliação”. Uma realidade que o leva a repetir as palavras de São Paulo: “O Senhor esteve ao meu lado e meu deu forças; ele fez com que a mensagem fosse anunciada por mim integralmente, e ouvida. A Ele a glória, pelos séculos dos séculos!”.


Luis Miguel Modino, assessor de comunicação CNBB Norte1

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