O Concílio
de Jerusalém tem sido a fonte de inspiração para o Pe. Timothy Radcliffe em sua
reflexão espiritual em preparação para o quarto Módulo da Assembleia Sinodal do
Sínodo da Sinodalidade, que refletirá sobre "Participação, Responsabilidade
e Autoridade", abordando a questão dos processos, estruturas e
instituições necessárias em uma Igreja sinodal missionária.
Enfrentando a primeira grande crise da Igreja
O
dominicano refletiu sobre um Concílio "chamado a enfrentar a primeira
grande crise da Igreja depois de Pentecostes". Uma Igreja profundamente
dividida, em uma crise de identidade. A partir daí, ele lembrou as palavras de
Francisco em Lisboa, onde ele disse que "amadurecemos através das
crises", na medida em que as abraçamos com esperança.
Igreja
significa reunião, enfatizou Radcliffe, que questionou a necessidade de nos
reunirmos "não apenas fisicamente, mas também em nossos corações e
mentes", se "estamos dispostos a ser atraídos para além de
mal-entendidos e suspeitas mútuas", se somos como o irmão mais velho
"que fica do lado de fora, recusando-se a se reunir na alegria do retorno
de seu irmão".
Trazendo paz a um mundo crucificado pela violência
Em sua
opinião, o Espírito Santo "nos reúne e nos envia, oxigenando a força vital
da Igreja", afirmando que "estamos reunidos para descobrir a paz
entre nós e somos enviados para proclamá-la ao nosso pobre mundo, crucificado
pela violência cada vez maior, na Ucrânia, na Terra Santa, em Mianmar, no Sudão
e em tantos outros lugares". A partir daí, ele refletiu sobre como ser um
sinal de paz se estivermos divididos entre nós.
Fazendo uma
comparação entre o Concílio de Jerusalém e o Sínodo, reunidos em nome do
Senhor, ele disse que isso "significa ter confiança de que a graça de Deus
está atuando poderosamente em nós". Para aqueles que lhe disseram que
"este Sínodo não mudará nada", ele disse que "isso é falta de fé
no nome do Senhor", pois "se nos reunirmos no forte nome da Trindade,
a Igreja será renovada, embora talvez de maneiras que não sejam imediatamente
óbvias", vendo isso não como otimismo, mas como "nossa fé
apostólica".
Uma identidade que reúne toda a Igreja dividida
A partir do
pensamento de Cornelius Ernst, ele observou que "a Igreja é sempre nova,
como Deus, o ancião e a criança recém-nascida". Analisando o Concílio de Jerusalém,
o padre Radcliffe afirmou que "os discípulos se reuniram porque viram que
Deus já estava fazendo algo novo. Deus os havia precedido. Eles precisavam
alcançar o Espírito Santo. Ali ele destacou a atitude de Tiago, que baseou sua
identidade "em um relacionamento de sangue com o Senhor", por isso
considerou maravilhoso "que seja ele quem proclama essa nova
identidade", considerando de grande valor e fé dizer "nós, uma
identidade que reúne toda a Igreja dividida", uma Igreja de judeus e
gentios, o que, de acordo com o dominicano, "levou tempo para ele, assim
como levou para nós".
Um novo
sentido de "nós", que ele disse ter experimentado durante a guerra
civil em Burundi, celebrando a Eucaristia quando viajou pelo país com dois de
seus irmãos, um hutu e um tutsi. Nesse sentido, "nosso Deus já está dando
vida a uma Igreja que não é mais primordialmente ocidental: uma Igreja que é
católica oriental, asiática, africana e latino-americana". Uma Igreja,
insistiu ele, "na qual as mulheres já estão assumindo responsabilidades e
renovando nossa teologia e nossa espiritualidade". Uma Igreja na qual
"os jovens de todo o mundo, como vimos em Lisboa, estão nos levando em
novas direções, em direção ao Continente Digital".
Abraçando a graciosa novidade de Deus
Radcliffe
insistiu que, em vez de perguntar o que fazer, precisamos questionar o que Deus
está fazendo, se aceitarmos sua graciosa novidade. A partir daí, observando a
atitude de Tiago, ele afirmou que "o novo é sempre uma renovação
inesperada do antigo", de modo que "qualquer oposição entre tradição
e progresso é totalmente estranha ao catolicismo".
"A
história da Igreja é uma história de criatividade institucional sem fim",
enfatizou, citando exemplos ao longo da história. A partir daí, ele perguntou
sobre as instituições necessárias "para expressar quem somos como homens e
mulheres de paz em uma era de violência, habitantes do Continente
Digital". A partir do fato de que toda pessoa batizada é um profeta, ele
perguntou como reconhecer e abraçar o papel da profecia na Igreja hoje, e mais
concretamente: "O que está acontecendo com a voz profética das mulheres,
que muitas vezes ainda são consideradas como 'hóspedes em sua própria casa'?".
Por fim,
ele lembrou que o Concílio de Jerusalém libertou os gentios de fardos
desnecessários, de uma identidade dada pela antiga Lei. A partir daí, ele
questionou "como tiraremos os fardos dos ombros cansados de nossos irmãos
e irmãs de hoje, que muitas vezes se sentem desconfortáveis na Igreja".
Por exemplo, "aquela jovem que cometeu suicídio porque era bissexual e não
se sentia bem-vinda", dizendo esperar que "isso tenha nos
mudado" e nos identifique com a Igreja na qual "todos são bem-vindos:
todos, todos, todos", lembrando as palavras de Francisco. Um caminho de
volta à Igreja, à casa do Reino que cada pessoa começa onde quer que esteja.
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